O caminho estreito e a conversão permanente 

Dom Antonio Carlos Rossi Keller

Bispo de Frederico Westphalen (RS)

 

O 21º Domingo do Tempo Comum, no Ano Litúrgico C, convida-nos a uma reflexão profunda sobre o caminho da salvação e a exigência do seguimento de Jesus. A mensagem central deste domingo gira em torno da necessidade de conversão, esforço e fidelidade na caminhada cristã. Jesus não oferece um caminho fácil ou cômodo, mas um caminho estreito, que exige decisão, renúncia e compromisso autêntico com o Reino de Deus. 

A pergunta que ecoa no Evangelho — “Senhor, são poucos os que se salvam?” — toca um tema sempre atual: a salvação. Mas Jesus não responde com estatísticas ou números. Em vez disso, chama à ação: “Esforçai-vos para entrar pela porta estreita!” A salvação não é garantida por pertencer a um grupo ou por tradições religiosas, mas pela vida transformada, pela fidelidade diária e pela abertura ao amor de Deus. Este domingo, portanto, é um convite urgente à conversão e à vigilância espiritual. 

Na 1.a Leitura (Isaías 66,18-21), o profeta Isaías anuncia uma visão universal da salvação: “Virei reunir todas as nações e todas as línguas… virão e verão a minha glória.” Neste trecho, Deus revela que sua salvação não se limita ao povo de Israel, mas se estende a todos os povos da terra. A imagem dos enviados a “todas as nações” prefigura a missão da Igreja, chamada a levar a Boa Nova a todos os cantos do mundo. 

A inclusão dos “irmãos” entre os povos estrangeiros mostra que ninguém está excluído da misericórdia divina. Além disso, o chamado de pessoas de todas as nações para o sacerdócio e para o serviço no templo é um sinal de que Deus escolhe e consagra a quem quiser, rompendo com exclusivismos e preconceitos religiosos. 

Esta leitura nos lembra que a salvação é um dom universal, mas que exige resposta: é preciso acolher a chamada, sair de si e tornar-se instrumento da glória de Deus. 

O salmo (Salmo 116) responde à 1.a Primeira Leitura com entusiasmo: se Deus abre as portas da salvação a todos, então todos são chamados a louvá-lo. A gratidão é a resposta natural ao amor fiel de Deus, que se manifesta em toda a terra. É um convite à ação de graças coletiva, que transcende fronteiras, línguas e culturas. 

Na 2.a Leitura (Hebreus 12,5-7.11-13), a Carta aos Hebreus apresenta a disciplina divina como sinal de amor paterno: “O Senhor corrige aquele a quem ama, e açoita a todo filho que aceita.” Aqui, a fé é vista como um processo de amadurecimento, que passa pela provação e pela correção. A disciplina, embora dolorosa no momento, produz “fruto de justiça e de paz” para os que são por ela exercitados. 

Esta leitura nos ajuda a entender que o caminho estreito não é somente um esforço humano, mas uma caminhada acompanhada por Deus, que nos corrige com amor, como um pai que deseja o bem de seus filhos. O sofrimento, quando vivido na fé, torna-se fonte de crescimento espiritual. 

O apelo final — “Endireitai os caminhos tortuosos, tornai firmes os joelhos vacilantes” — é uma exortação à perseverança. Mesmo cansados, devemos continuar em frente, fortalecidos pela presença de Deus. 

No Evangelho (Lucas 13,22-30), Jesus, em sua viagem para Jerusalém, é questionado: “Senhor, são poucos os que se salvam?” Em vez de responder diretamente, Ele desloca a pergunta do campo da curiosidade para o da responsabilidade pessoal: “Esforçai-vos para entrar pela porta estreita!” 

A “porta estreita” simboliza o discipulado exigente, que exige conversão, humildade e amor ao próximo. Não basta dizer “comemos e bebemos na tua presença” ou “pregaste em nossas praças” — é preciso viver segundo a vontade de Deus. Muitos que pensam estar salvos podem ficar de fora, enquanto outros vindos “do oriente e do ocidente, do norte e do sul” entrarão no Reino”. 

Este evangelho é um forte chamado à vigilância e à autenticidade. A salvação não é automática nem herdada; é fruto de uma relação viva com Cristo, traduzida em obras de justiça, misericórdia e verdade. 

Diante da Palavra de Deus deste domingo, somos convidados a não apenas ouvir, mas a agir. Eis três indicações práticas para viver o espírito da “porta estreita” nesta semana: 

Revisar nossos compromissos com o Evangelho: fazer um exame de consciência: onde estou sendo cômodo na fé? Onde evito mudanças porque exigem esforço? Escolher um aspecto da nossa vida (oração, relacionamentos, uso do tempo, justiça social) e buscar colocar em prática uma pequena conversão concreta. A porta estreita começa com passos pequenos, mas firmes. 

Praticar a misericórdia com quem está “fora”: a salvação é universal, mas muitos se sentem excluídos — pela dor, pelo pecado, pela marginalização. Esta semana, vamos procurar alguém que julgamos ou ignoramos e vamos oferecer um gesto de acolhida: uma palavra de paz, um sorriso, um pedido de perdão ou uma ajuda silenciosa. Assim, ajudamos a abrir a porta do Reino para os outros — e para nós. 

Acolher as dificuldades como oportunidade de crescimento: aoenfrentarmos provações — seja no trabalho, na família ou na saúde — lembremo-nos da lição da Carta aos Hebreus: Deus educa por amor. Em vez de reclamar ou desistir, oremos pedindo força e significado. É preciso ver cada desafio como um “exercício espiritual” que nos prepara para o Reino. 

21º Domingo do Tempo Comum nos lembra que a salvação é um dom gratuito, mas que exige resposta. Não é uma herança automática, mas um caminho a ser trilhado com esforço, humildade e amor. Que a Palavra deste domingo nos desperte para a seriedade do seguimento de Cristo e nos inspire a viver com autenticidade, esperança e misericórdia. A porta estreita é difícil, mas do outro lado está a festa do Reino — onde todos os povos se encontrarão na glória de Deus. 

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