A caridade pastoral deve animar a mística do nosso serviço pastoral. No início deste ano pastoral, quando a vida das paróquias e comunidades vai retomando seu ritmo, quero recordar algo próprio da identidade e da missão da Igreja e de cada um de nós, seus membros. A Igreja presta muitos serviços à sociedade, mas ela é mais que uma estrutura funcional e burocrática, ou uma prestadora de serviços. Ela é uma comunidade de fé, vida e testemunho e sua identidade vai além de suas expressões visíveis e de seus serviços e manifestações concretas.
A Igreja é a comunidade de fé reunida em torno de Cristo, “autor e consumador de nossa fé”. Como lemos na conclusão da Carta aos Hebreus, Ele, pelo sangue da sua cruz, selou uma nova aliança entre Deus e a humanidade e “se tornou o grande pastor das ovelhas” (13, 20). Por isso, perto dele e com ele, a comunidade dos fiéis está segura e tranquila como as ovelhas, ao redor de seu pastor; ele conhece cada uma pelo nome e elas o reconhecem pela voz; elas sabem que o Pastor as ama, protege e defende, conduz por caminhos bons e as leva a pastagens abundantes, águas frescas e sombras repousantes. As ovelhas estão bem com seu pastor verdadeiro, pois sabem que nada lhes faltará (cf Sl 22).
Ao mesmo tempo que é cuidada e beneficiada pelo amor carinhoso do seu Senhor e Pastor, a Igreja é chamada a participar das preocupações e dos sentimentos de seu coração e de sua missão. No Evangelho de S.Marcos, Jesus está sempre rodeado de multidões sedentas de ouvir sua palavra e de experimentar “a força que saía dele” (cf Mc 5,30). Jesus convoca os apóstolos e os associa à sua missão, enviando-os dois a dois (6,7-13), enquanto ele próprio continua a percorrer os povoados da região, ensinando (6,6). A grande messe necessita de muitos operários!
Mais adiante, os discípulos voltam e contam tudo o que realizaram (6,30ss). Estão felizes, mas cansados, e Jesus os convida a descansar num lugar sossegado. As multidões, porém, chegam lá primeiro… “Não tinham nem tempo para comer” (6,31). Vendo as multidões, Jesus teve compaixão delas, “eram como ovelhas sem pastor”. O descanso acabou, tudo começa outra vez e Jesus “lhes ensina muitas coisas” (v. 34). O bom Pastor gasta a vida pelas ovelhas, sem medir esforços, por amor a elas.
Ovelhas ou discípulos de Cristo, com ele e em nome dele, somos também missionários e pastores. Por isso a Igreja exerce seus serviços “pastorais” e faz planos de pastoral de conjunto, para que a globalidade da missão fique devidamente atendida; todos precisam assumir sua parte na missão pastoral da comunidade e desempenhá-la como graça e tarefa que decorre do batismo. Cada batizado é associado à missão pastoral de Cristo e nossas comunidades de fé precisam ser criativas e ricas em iniciativas pastorais, para que todos possam unir esforços em favor da “imensa messe”, do grande rebanho do Senhor; não como mero programa estratégico, nem com ativismo árido, mas tendo no coração os mesmos sentimentos de Jesus Cristo, bom Pastor: “teve compaixão delas”…
Nosso 10º Plano Arquidiocesano de Pastoral é um convite a exercermos, de fato, nosso serviço pastoral nas condições desafiadoras da grande cidade de São Paulo. Aqui também há multidões que vivem “como ovelhas sem pastor”. Podem estar bem perto de nós, talvez nem nos demos conta disso! São doentes e idosos nas casas e hospitais; jovens nas escolas, pobres e mendigos na praça, pessoas desamparadas pela sociedade e angustiadas em relação ao seu futuro; são as vítimas das injustiças e da violência diária; são os iludidos pelas propostas mercadológicas da religião e pelos aproveitadores do rebanho do Senhor.
Não podemos dizer que tudo isso não nos importa e que já temos tantas ovelhas para cuidar! O 10° Plano de Pastoral, de acordo com as orientações da Conferência de Aparecida, nos convida a lançarmos um olhar ao nosso redor, não como frios analistas sociais, mas como discípulos e missionários de Cristo; em outras palavras, com os sentimentos de Cristo, Pastor do rebanho, que nos confia seus sentimentos e diz: “tenho pena desse povo!”