Dom Rodolfo Luís Weber
Arcebispo de Passo Fundo (RS)
O Mês da Bíblia que iniciamos exorta para que a Palavra de Deus ocupe o lugar que lhe é de direito na vida pessoal, na liturgia e na pastoral da Igreja. A escolha deste mês tem como inspiração São Jerônimo que viveu de 340 a 420. Naquela época, muitos cristãos de língua latina não conseguiam ter acesso a Bíblia por causa da língua. Jerônimo foi residir em Belém e se empenhou para que toda Sagrada Escritura pudesse ser lida em latim. Além de traduzir, escreveu muitos comentários sobre a Sagrada Escritura que se conservam e contêm uma riqueza de conteúdo com validade permanente.
O Cardeal José Tolentino de Mendonça, especialista em estudos bíblicos, oferece orientações muito sábias para nos aproximarmos da Palavra de Deus. Escreve na introdução de sua obra A leitura infinita: a Bíblia e a sua interpretação. “Por um lado, a Bíblia exerce uma atração inesgotável. Por outro, essa atração mostra-nos rapidamente que precisamos de uma iniciação ao mundo textual que ali está presente. Não basta lermos a Bíblia: precisamos de uma hermenêutica, por mais simples ou complexa que seja. A Palavra bíblica é uma janela, um espelho, uma fonte ou uma lâmpada, e em todas essas modalidades é imprescindível não só a construção do caminho crente, mas também a maturação cultural. Porém, não se acede a ela sem ativar uma espécie de arte da leitura”.
Se por um lado o texto bíblico atrai por aquilo que revela e ensina, por outro lado exige o esforço do leitor. O leitor precisa situar a leitura bíblica no contexto histórico onde foi escrito e na interpretação procurar ser fiel ao que foi escrito. Em outras palavras, não é possível interpretar o texto simplesmente ao gosto do leitor e nem fazê-lo dizer o que não está escrito.
Não é possível dizer em poucas palavras o que é a Bíblia. São sugestivas as analogias que o Cardeal faz: A Palavra bíblica é uma “janela” através da qual se descortina um horizonte bem amplo. É um “espelho”, pois quando estamos diante do espelho, vemo-nos refletido nele, isto é, o leitor começa a fazer parte da cena bíblica. A Bíblia é “fonte” que nunca se esgota e para a qual se pode voltar sempre e sempre terá novidade. É “lâmpada” pois a luz é essencial para ter vida e para permitir os olhos verem.
O Cardeal José Tolentino também alerta “que é inútil impor um programa de compreensão, quando nos é pedido o contrário: que nos exponhamos ao texto, na nossa fragilidade, a fim de receber dele, e à maneira dele, um eu mais vasto”. Para orientar os fiéis na leitura bíblica, a Igreja distribuiu os textos bíblicos na liturgia eucarística. Os textos bíblicos dos domingos estão organizados num ciclo de três anos e os dos dias das semana em dois anos. Deste modo, o fiel ao participar das celebrações eucarísticas terá contato com toda Escritura. Não são lidos apenas os textos escolhidos pelo leitor, mas aqueles que lhe são oferecidos, assim o leitor acolhe o que foi oferecido.
Neste domingo os textos que Igreja nos oferece são Jeremias 20,7-9, Salmo 62, Romanos 12,1-2 e Mateus 16,21-27. Os leitores são convidados a se exporem a estes textos e acolherem o que transmitem. Jesus anuncia que deve ir a Jerusalém onde irá sofrer, ser morto e ressuscitar ao terceiro dia. Pedro na tentativa de proteger Jesus age ao modo humano, por isso lhe é dito: “não pensas de acordo com Deus, mas de acordo com os homens”. Toda a Escritura tem por objetivo aperfeiçoar o modo de pensar e ser para configurar o leitor ao modo divino. Diz a Carta aos Romanos: “Não vos conformeis com o mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de pensar e de julgar, para que possais distinguir o que é da vontade de Deus, isto é, o que é bom, o que lhe agrada, o que é perfeito”.