Dom João Santos Cardoso 
Arcebispo de Natal (RN)

 

 

“As guerras são sempre uma derrota” (Papa Francisco, 15/10/23)

Em tempos de guerra, cresce o apelo à paz. Entretanto, mais do que pedir pela paz, devemos promover uma cultura de paz. As disputas internacionais podem ser resolvidas por meio da razão e de negociações baseadas no direito, na justiça e na equidade, sem a necessidade de recorrer às armas ou à destruição (São Papa Paulo VI, 01/01/1968). 

A promoção da cultura de paz é inerente à missão do cristão (Mc 16,15). O Evangelho é, antes de tudo, um anúncio de paz: “Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: ‘Paz a esta casa!'” (Lc 10, 5). Promover a cultura de paz é dever de toda pessoa de boa vontade: “Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5, 9). 

A expressão “cultura de paz” tem surgido em vários documentos eclesiais. Em 1963, no contexto da Guerra Fria, da corrida armamentista, da luta armada e das desigualdades econômicas, o Papa João XXIII, na encíclica “Pacem in Terris” (n.166), disse que “a paz permanece uma palavra vazia de sentido, se não se fundar numa ordem estabelecida na verdade, construída segundo a justiça, alimentada e consumada na caridade, realizada sob os auspícios da liberdade”. 

A Igreja Católica pode oferecer uma grande contribuição à sociedade no âmbito da educação e da promoção da cultura de paz. Nesse campo, a Igreja dispõe de um rico patrimônio cultural e espiritual, proveniente das Sagradas Escrituras e do seu Magistério. 

Jesus viveu em tempos violentos, mas ensinou que o verdadeiro campo de batalha entre violência e paz reside no coração humano, de onde “surgem os maus pensamentos” (Mc 7, 21). Aqueles que seguem a mensagem de Jesus reconhecem a violência em si mesmos e buscam a cura pela misericórdia de Deus, tornando-se instrumentos de reconciliação (Papa Francisco, 2017). 

Jesus nos ofereceu uma mensagem radicalmente positiva em favor da paz. Ele nos ensinou que o amor de Deus é incondicional e promoveu o perdão, o amor aos inimigos, a não-violência como forma de superar os conflitos, a não resistir ao malvado e a oferecer a outra face (Mt 5, 39). “O amor ao inimigo constitui o núcleo da ‘revolução cristã’ […] e ‘a magna carta da não-violência cristã’, disse o Papa Francisco em sua Mensagem no Dia Mundial da Paz de 2017, acrescentando que “esta não consiste em render-se ao mal (…), mas em responder ao mal com o bem (Rm 12, 17-21), quebrando dessa forma a corrente da injustiça”. 

A não-violência não se confunde com rendição, negligência e passividade. O Papa Paulo VI (1968) afirma que “do Evangelho pode brotar a paz, não para tornar os homens fracos e moles, mas para substituir nos seus corações os impulsos da violência e da prepotência, pelas virtudes civis da razão e do coração de um humanismo verdadeiro”. 

Através da educação de nossos jovens e crianças, é possível promover a não-violência como um estilo de vida. Tanto a escola quanto a família podem ser pensadas como espaços de educação para a convivência civilizada, onde se aprende a cultura de paz. “Se a origem de onde brota a violência é o coração humano, então é fundamental começar por percorrer o caminho da não-violência dentro da família” (Papa Francisco, 2017). A partir da família, a alegria do amor propaga-se pelo mundo, irradiando para toda a sociedade. Na família, cônjuges, pais, filhos, irmãos e irmãs aprendem a se comunicar e cuidar uns dos outros de maneira desinteressada, resolvendo atritos e conflitos através do diálogo, respeito, busca do bem do outro, misericórdia e perdão. 

Não podemos nos acostumar com a violência, a guerra e a banalização do mal, mas devemos nos empenhar “nos diferentes níveis, para realizar a justiça e trabalhar pela paz. Na verdade, esta é um dom de Deus e um trabalho dos homens” (Papa Francisco, janeiro/2016). 

 

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