Dom Pedro Cipollini
Bispo de Santo André (SP)
No calendário existe um dia que é o dia do passado de toda a humanidade: dia de Finados ou dos Mortos. Não sei de nenhuma religião que acredita na morte como o fim de tudo. O fim de nosso corpo e de suas funções vitais sim, mas a certeza da imortalidade está impressa no inconsciente, no íntimo de cada pessoa. Existe a imortalidade daquilo que se chama “alma”, concordam as religiões. A partir deste ponto há divergência. Para onde irá a alma?
O cristianismo, com base na Bíblia, acredita que Jesus nos dá a resposta mais clara. Nossa morte é a entrada imediata na forma definitiva de vida para a qual fomos criados: a vida eterna. Nossa vida nesta terra é passageira, é uma preparação para a vida plena da eternidade.
Nossa existência nesta terra pode ser comparada aos nove messes de gestação que precede nosso nascimento. Por isso nós cristãos chamamos o dia de nossa morte die natalis (dia do nascimento). Dizia uma santa: “Não morro, entro na vida!”. É nesta perspectiva que celebramos os falecidos: na perspectiva da vida eterna, da ressurreição, pois, ultrapassar a morte é a ressurreição. Cristo ressuscitou e com ele ressuscitam os que creram nele e o seguiram (cf. Fl 3,11).
Nós cristãos, vemos a morte à luz da morte e ressurreição de Jesus. Na luz da Páscoa! Jesus morreu para nós na cruz e ressuscitou. Assim, também os que morreram, tendo fé em Jesus Cristo, serão reunidos por Ele para estarem em sua gloriosa companhia. Jesus deu a vida por nós, e esta vida comunicada a cada batizado é a vida eterna: “Quem crê em mim não morrerá jamais!” (Jo 11, 26)
Na Igreja Católica, recordamos os irmãos e irmãs falecidos, com preces e sufrágios. É a “comemoração de todos os fiéis defuntos”. Relembrar os mortos em celebração religiosa, é costume humano na maioria dos povos. Também nós cristãos, desde o século II, temos o costume de recordar os fiéis defuntos, com orações que, com o tempo, foram vinculadas à celebração eucarística, a santa missa.
O atual dia de finados surgiu no ano 998, quando o abade Odilon de Cluny, na França, determinou a todos os mosteiros de sua Ordem, a celebração no dia 2 de novembro, da memória de todos falecidos. Este exemplo logo se espalhou por toda a Europa.
Assim, nossa celebração de hoje não é tristeza ou dor estéril. É marcada pela saudade, mas não pelo desespero. É antes de tudo ação de graças pela vida dos que nos precederam. Tem odor de Páscoa, nosso dia de finados. Comemoramos os nossos irmãos falecidos, não só com saudades ou pensando que os perdemos para sempre. Comemoramos com a esperança de quem acredita que eles estão vivos em Cristo: “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11,25).
Jesus ressuscitado nos dá a esperança certa e segura de vencermos a morte como Ele venceu. Alegremo-nos com São Paulo que escreve: “Temos esperança no nosso salvador glorioso, Jesus Cristo. Ele transformará nosso corpo mortal à imagem do seu corpo glorioso” (Fl 3, 20-21).
Que todos os que partiram desta vida estejam em paz! Consolemo-nos uns aos outros com palavras de fé e vivamos no amor de Cristo. É assim que vencemos o medo da morte e a própria morte!
