O padre Peter Stilwell, reitor da Universidade Católica em Macau, acredita que o acordo provisório entre o Vaticano e a China irá favorecer no futuro uma Igreja Católica “vigorosa”, para benefício de toda a região.
Em entrevista à Agência Ecclesia, o sacerdote português, antigo vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, salienta que para já o entendimento entre as duas partes levou a Santa Sé a “reconhecer os sete bispos da chamada Igreja patriótica (ligada ao Estado chinês) que até agora não era considerada por Roma”.
Agora é preciso que também o governo de Pequim dê também um passo em frente naquilo que o padre Peter Stilwell espera que “represente um degelo” nas relações entre as duas partes.
O afastamento entre o Vaticano e a China dura desde 1951, com o fim das relações diplomáticas, depois do governo de Pequim expulsar todos os missionários estrangeiros, tendo muitos deles seguido para Hong Kong, Macau e Taiwan.
Um ano depois, o Papa Pio XII recusaria a criação de uma Igreja chinesa, como era intenção de Pequim, a chamada Associação Patriótica Chinesa (APC), e reconheceria formalmente a independência de Taiwan, para onde tinha seguido o núncio apostólico (embaixador da Santa Sé) em Hong Kong.
Em 1957, a China avançou mesmo para a criação da APC, à margem da Santa Sé, com o pretexto de evitar “interferências estrangeiras” e para assegurar que os católicos viviam em conformidade com as políticas do Estado, deixando assim na clandestinidade os fiéis que reconhecem a autoridade direta do Papa, ou seja, toda uma outra Igreja Católica ficou na clandestinidade.
Estima-se que atualmente existam cerca de 10 a 12 milhões de católicos na China, cerca de 6 a 7 milhões integrados na chamada Igreja clandestina.
Para o padre Peter Stilwell, apesar deste entendimento entre a Santa Sé e a China estar ainda numa fase muito inicial, já existem alguns sinais que fazem acreditar num desfecho risonho.
“É interessante ver que os dois bispos que foram para o Sínodo dos Bispos em Roma agora a semana passada, ou há 10 dias, um deles é da Igreja chamada clandestina, e outro da chamada Igreja patriótica”, exemplifica o sacerdote, referindo-se respetivamente à presença dos prelados D. Yang Xiaoting, da Diocese de Ya’na, e D. Guo Jincai, bispo de Chengde.
Sobre a forma “como as duas comunidades católicas se vão entender e acabar por entrosar e formar uma só Igreja na China, o reitor da Universidade Católica de Macau recorda outros episódios em que o desfecho acabou por ser positivo e frutuoso, como o caso da “antiga União Soviética”.
“Quando ela entrou em colapso e os países de Leste da Europa encontraram outras formas de gerir a sua vida política, havia também uma Igreja dita clandestina e outra que era reconhecida pelo Estado. E não foi fácil inicialmente as duas comunidades entenderem-se”, realça o responsável.
O padre Peter Stilwell espera que “com o tempo, e à medida que as feridas se vão sarando, haja uma Igreja vigorosa, católica, na China, que possa colaborar com as autoridades chinesas para o desenvolvimento do povo chinês”.
“Nomeadamente naquilo que a Igreja tem de precioso, que é o sentido ético, o sentido de responsabilidade pelo bem-comum, da entrega ao serviço da comunidade. São tudo valores que a Igreja traz e que certamente beneficiarão a China em geral”, acrescenta.
No que toca aos benefícios que este acordo poderá trazer para a região de Macau, nomeadamente para a Universidade Católica de São José, o padre Peter Stilwell frisa que em termos da vivência da fé esta situação não tem influência, pois “em Hong Kong e Macau, de acordo com as leis básicas das duas regiões autônomas, mantém-se o regime de liberdade religiosa, o mesmo regime para a Igreja Católica que tinha antes da entrega destes territórios”.
“Tem sido respeitadíssima a Igreja em Macau e em Hong Kong, e portanto aí não há qualquer questão”, reforça o sacerdote.
No campo de ação da Universidade Católica de Macau, este acordo poderá vir a melhorar a situação, nomeadamente no que diz respeito a um desafio “de longa data” para a instituição, “que é querer recrutar alunos da China continental”.
Algo que “é necessário não por uma questão de sobrevivência mas de desenvolvimento da Universidade”.
“Macau é um território pequeno, a demografia de Macau, nestes últimos anos, ao nível dos alunos a sair do ensino secundário é uma demografia em decrescendo, e portanto, ao longo dos próximos cinco, seis anos os números não chegam para o número de universidades e politécnicos que temos em Macau”, explicou o padre Peter Stilwell.
Atualmente, a solução da Universidade Católica de Macau tem sido “recrutar fora” do território, com um terço dos alunos da instituição a serem “internacionais”, muitos deles provenientes de outros países asiáticos, como a Tailândia, Singapura e o Vietname.
“Julgamos que temos um patrimônio em termos acadêmicos que é de utilidade e de interesse para a China, porque somos uma universidade muito internacional, com as ligações aos países lusófonos, está inscrito no nosso ADN, que é qualquer coisa que a China está muito interessada em desenvolver, por causa das ligações comerciais e políticas que tem com os países lusófonos. E julgamos que poderíamos contribuir significativamente para isso”, defende o reitor da Universidade Católica em Macau.
Dentro em breve, a instituição vai submeter um novo pedido ao Governo central de Pequim, no sentido de poder recrutar alunos em território chinês.
“Tem de ser o Ministério da Educação a permitir que os alunos se inscrevam na nossa universidade, vamos ver como é que reage. Estas coisas levam tempo e portanto vamos funcionando com calma, sempre na vontade de colaborar com as autoridades locais”, completa o padre Peter Stilwell, que assumiu os destinos da Universidade Católica de Macau em 2012.
JCP
(Texto: Agência Ecclesia)