São Sebastião e o nosso tempo

Dizem que a vida no Brasil só se inicia após o carnaval. Aqui no Rio de Janeiro estamos vivenciando um momento inicial muito importante: após o tempo em que celebramos o Mistério da Encarnação, estamos comemorando o dia do padroeiro da cidade e da Arquidiocese: São Sebastião com novena, tríduo, celebrações, visitas, carreatas, procissões.

Além das celebrações paroquiais (são mais de 35 comunidades dedicadas ao nosso padroeiro), a grande celebração arquidiocesana deve ajudar, neste início de ano, a abertura do coração para Deus sabendo enfrentar, como São Sebastião, os desafios do nosso tempo! Ele, a quem não bastaram as flechas para calar a sua voz, é um verdadeiro atleta invencível da fé que nos entusiasma no seguimento de Jesus Cristo hoje em nossa grande metrópole.

Depois de encerrado o ciclo do Natal, o ano litúrgico segue adiante, celebrando os mistérios de nossa salvação. O período litúrgico no qual agora entramos, conhecido pelo nome de Tempo Comum, oferece-nos uma grande oportunidade de ouvir atentamente a Palavra de Deus, participar consciente e ativamente das ações litúrgicas e colocar em prática tudo o que de Deus recebemos através de sua Santa Igreja. Isso tudo mesclado com as festas e solenidades de Cristo, de Maria e dos Santos.

Agora é o tempo de ruminar o que vivenciamos nas solenes celebrações dos grandes mistérios cristãos, tempo de escutar no dia-a-dia os diversos ensinamentos de Jesus, e tempo de iluminar o mundo com a Luz que brilhou para nós com singular intensidade no Natal, enquanto, agora, nos preparamos para a Páscoa do Senhor. E aqui temos a grande alegria de termos São Sebastião para ser um exemplo de vida a seguir em nossa luta por um mundo mais justo e fraterno.

O grande desafio deste tempo é o de viver, de forma extraordinária, a fé, a esperança e a caridade em meio aos acontecimentos ordinários da nossa vida.    É o desafio de viver de tal modo que, se nos faltasse Deus, faltaria o ar que respiramos. Sim, Deus deve ser como que o ar que respiramos, sem o qual não podemos viver. A união íntima com Deus leva-nos, impreterivelmente, ao encontro com os irmãos, principalmente com os mais necessitados, com os quais Jesus mesmo quis se identificar.

A primazia de Deus em nossa vida resulta em verdadeiro reconhecimento do irmão, pois a fraternidade acontece à medida que reconhecemos que Deus é o único Pai de todos os povos.

São Sebastião, que ora nos preparamos para celebrar em nossa Cidade e Arquidiocese foi alguém que, firme na fé até o final de sua vida como mártir, enfrentou as dificuldades e é exemplo de vida cristã para o homem de hoje. Aquele que se encontrou com Cristo e vive na comunhão com Deus é alguém que também dá testemunho do Cristo Ressuscitado. Ele nos ensina a viver com coragem sempre nova, confiando na construção desse mundo novo que é viver como pessoas consagradas a Deus num mundo de irmãos.

Não nos devemos esquecer de que a vivência cristã nem sempre é um “mar de rosas”. No mundo operam forças obscuras e contrárias a Deus, que devem ser superadas e vencidas pelo nosso testemunho destemido e valente. Não devemos ter medo. A fé deve ser vivida e anunciada sem receios, em meio às contradições da vida e à oposição das forças do mal. Nesse sentido o nosso padroeiro, torturado e martirizado é um sinal para vermos até que ponto chega o ódio contra os que professam a fé.

Deus sempre sustenta neste mundo aquele que, de coração sincero, procura seguir os passos do Filho unigênito. É assim que ouviremos a Palavra de Deus neste tempo.   Os textos evangélicos dos domingos neste ano litúrgico – ano “C” – são os de São Lucas. O Evangelho de Lucas é reconhecido por manifestar, contundentemente, a misericórdia de Deus presente nas atitudes, palavras e gestos de Jesus de Nazaré. A sensibilidade de Jesus para com os sofredores, para com os que padecem de misérias espirituais ou temporais é realçada por Lucas com maestria.

Assim, podemos reaprender a cada dia a imitar a compaixão divina e, na medida das nossas possibilidades, levar o doce bálsamo da misericórdia a quem dele mais precisa. Não faltará misericórdia àquele que agir com misericórdia! É promessa do Senhor! Façamos a experiência!

É o que pedimos também a Deus, inspirados pelo nosso padroeiro – para que nos ensine a não desanimar com as flechadas da vida e continuar firmes na fé para a construção de uma vida mais justa e solidária. Para nós é também um reforço à nossa cultura: a réplica da imagem de São Sebastião trazida por Estácio de Sá há 445 anos levada em carreata é testemunha da história deste povo e dos acontecimentos que nortearam a vida de nossos antepassados. É justamente essa história que nos impulsiona tanto a viver com radicalidade a nossa identidade cristã, assim como ter a coragem para um diálogo com os demais cristãos, outras religiões e diversas culturas. São passos imprescindíveis para o tempo que se chama hoje.

Desejo a todos uma verdadeira “paixão” pelas coisas de Deus, como nos dão exemplo os santos e santas. É Deus o único a dar verdadeiro sentido à nossa vida. Não podemos concordar com mentalidade secularizada reinante, mentalidade que tenta levar o homem moderno a viver como se Deus não existisse. O resultado de uma vida e de uma sociedade sem Deus é o vazio existencial e o pragmatismo e relativismo que deixam de lado a busca da verdade. A vida dos Santos é uma boa notícia que ajuda a humanidade a encontrar sua identidade e suas verdadeiras raízes.

Bento XVI, na homilia que fez na última noite de Natal, ciente da importância da centralidade de Deus em nossa vida, convidou-nos a “colocar em segundo plano as outras ocupações, por mais importantes que sejam, para nos encaminhar para Deus, para deixar que Ele entre em nossa vida e em nosso tempo”.

Desejando que as celebrações do nosso padroeiro nos encaminhem para viver com alegria ainda mais e tornar ainda mais bela esta cidade, como um dos mais novos cidadãos desta metrópole, peço a Deus uma bênção especial e envio uma saudação às autoridades e a todos que aqui habitam ou que por aqui passam. Deus está no meio de nós! Que a paz habite em nossos corações e atividades.

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