Dom Caetano Ferrari
Diocese de Bauru (SP)
Que sem perdão não há amor, não há paz, não há comunidade, isto nós bem sabemos. No Evangelho da santa Missa de hoje, sequência do domingo passado, Jesus dá a Pedro aquela resposta que todos conhecemos: “Não te digo que se deve perdoar até sete vezes, mas até setenta vezes sete”. Pedro fizera uma pergunta pessoal: “Quantas vezes devo perdoar se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?” Para explicar, então, Jesus contou uma parábola. Lembremo-nos que Jesus tinha ao seu redor os seus discípulos e ensinava-lhes muitas coisas sobre a compreensão, a correção fraterna, o perdão como condições para se construir uma comunidade no amor e na paz. Misturo palavras minhas às de Jesus para resumir o que Ele contou. O Reino dos céus é como um rei que resolveu acertar as contas com os seus empregados. Um que lhe devia uma enorme fortuna disse que não tinha com que pagar a dívida. O patrão determinou que fosse vendido como escravo, junto com a mulher e os filhos e tudo o que possuía para quitar a dívida. O empregado caiu de joelhos e, prostrado, suplicou um prazo dizendo que pagaria o que devia. O patrão teve compaixão, soltou o empregado e perdoou-lhe toda a sua dívida. Aquele empregado, ao sair, encontrou um companheiro de trabalho que lhe devia apenas cem moedas. Ele o agarrou pela garganta, cobrando-o: “Paga o que me deves”. O companheiro suplicava: “Dá-me um tempo e eu te pagarei”. Mas, o empregado não quis saber e mandou jogá-lo na prisão até que pagasse o que devia. Outros empregados que assistiram a cena ficaram tristes e foram procurar o patrão para contar tudo o que tinha acontecido. Então o patrão mandou chamar o empregado e lhe disse: “Empregado perverso, se eu perdoei a tua dívida, não devias tu também ter compaixão e perdoado a dívida do teu companheiro?” O patrão mandou entregar aquele empregado aos torturadores até que pagasse toda a dívida. E Jesus concluiu a parábola dizendo aos discípulos: “É assim que o meu Pai que está nos céus fará convosco se cada um não perdoar de coração ao seu irmão”.
Ter compaixão como Jesus sempre teve, perdoar como Jesus sempre perdoou é a regra do mandamento novo que Ele nos ensinou. Jesus nos mostrou com que medida devemos perdoar aos irmãos, isto é, segundo a medida do amor misericordioso do Pai, perdoar do fundo do coração e sempre. O Pai tanto nos amou que enviou a este mundo o seu Filho, e Jesus tanto nos amou que deu a vida por nós. Certa vez, Jesus perdoou uma pecadora que lhe demonstrou muito amor ao lhe lavar os seus pés e enxugá-los com os seus cabelos. “Por essa razão, Jesus lhe disse que os seus numerosos pecados lhe são perdoados, porque você demonstrou muito amor. Mas, aquele a quem pouco foi perdoado mostra pouco amor” (Lc 7, 47). Jesus deu o perdão a Pedro arrependido. No alto da cruz ofereceu o paraíso ao bom ladrão e o perdão aos pecadores. Jesus veio não para condenar, mas para perdoar e salvar os que confiam em sua misericórdia. Jesus nos mandou perdoar-nos mutuamente e concedeu à sua Igreja e seus ministros o Espírito Santo para que com o seu poder perdoem os arrependidos, deem-lhes a vida nova, estabeleçam a paz no mundo e construam a comunidade na caridade recíproca entre irmãos e no amor acima de todas as coisas a Deus.
Neste mês da Bíblia a Igreja recomenda que tomemos por texto-guia na leitura da Bíblia a Exortação Apostólica Pós-Sinodal “Verbum Domini” (A Palavra do Senhor) assinada pelo Papa emérito Bento XVI. Porque este é um documento excelente para nos ajudar a amar cada vez mais a Palavra de Deus. Sintamos, por exemplo, como no número 9 o documento aborda os temas da “inspiração divina” e da “verdade das Escrituras”. O documento tem presente o que a “Dei Verbum” (A Palavra de Deus) do Concílio Vaticano II fala: “Os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro a verdade de Deus, porque são inspirados, ou seja, foram escritos por inspiração do Espírito Santo e têm Deus por autor” nº 11). Sob o tema da “inspiração”, o documento afirma que “Também aqui se pode sugerir uma analogia: assim como o Verbo de Deus se fez carne por obra do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, assim também a Sagrada Escritura nasce do seio da Igreja por obra do mesmo Espírito”. Sob o tema da “verdade”, afirma que está ligado ao da “inspiração”: “Por isso, um aprofundamento da dinâmica da inspiração levará, sem dúvida, também a uma maior compreensão da verdade contida nos livros sagrados”. Não deve haver dúvida entre nós de que “inspiração e verdade são dois conceitos-chave para uma hermenêutica eclesial das Sagradas Escrituras”. Um aprimoramento na compreensão destes dois conceitos produzirão bons frutos tanto para o nosso conhecimento da Bíblia como também para a nossa vida espiritual. Sob os conceitos de “inspiração e verdade das Escrituras”, podemos ter certeza de que, como afirma o Catecismo, “tudo o que o ser humano precisa saber sobre Deus e sobre o caminho da sua redenção encontra-se com infalível segurança na Sagrada Escritura” (Youcat, 15).