Ternura Sim, Corrupção Não

Dom Orlando Brandes

Inocência é transparência, honestidade, fidelidade, coerência de vida. Símbolo da inocência é a criança. Sociologicamente falando, a inocência é a superação do espírito de arrogância, inveja, competição, corrupção e mentira.

Inocência é a “glasnost”, uma mudança cultural e ética dos povos e nações, que consiste na confiança entre as pessoas, na convivência solidária alicerçada no amor, na verdade, na justiça, na liberdade e no bem. Inocência é o estado de vida desejado pelo criador no paraíso, ou seja, vivermos como filhos de Deus, irmãos dos outros, amigos de nós mesmos, cuidadores da natureza. Vamos hoje refletir sobre “a inocência na sociedade”.

1. O principio de inocência. É a sociedade humana projetada por Deus: filiação divina, fraternidade humana, transformação da natureza, aceitação de si. Este “princípio de inocência” é o reino de Deus rezado na oração do Pai-Nosso: o pão, o irmão, o Pai, o bem. Portanto, o reino de Deus, o “paraíso”, o “princípio de inocência”, a sociedade solidária e a oração do Pai-Nosso, são a mesma coisa, são o sonho de Deus e a esperança de todos nós.

2. A saudade da inocência. Diz a psicologia transacional que nós carregamos em nossa psique a criança que fomos. Quando brincamos, sorrimos, dançamos, pulamos, cantamos, estamos liberando a criança. A infância de coração consiste em “eu ser eu mesmo”, deixar de representar papéis e personagens, enfim, viver a pessoa que sou. Quanto mais somos, mais comunicamos. Isso significa desistir das mascaras, das ficções do status, da aparência, do verniz e da pintura que cobrem e falsificam nosso ser real. Infância de coração é desistir de querer apresentar uma imagem colorida e de lutar por esta imagem irreal, quimérica e fantasmagórica. É preciso reconquistar a coragem de ser. A infância de coração devolve-nos o “eu real”. A saudade da inocência é a saudade de coerência, de humildade, de sinceridade, de honestidade. É a saudade de ser.

3. Infância e conversão. A criança confessa sua falta. Ela não racionaliza, não, não faz pose diante de Deus. Por isso, o reino dos céus será dado aos que se assemelham às crianças. Converter-se, mudar de vida implica em “fazer-se criança”. O arrependimento equivale a um renascimento, restitui a inocência. Aqui a criança é o modelo do adulto. Sem o espírito da infância não haverá ruptura com o pecado, não acontece a conversão. A saudade da inocência ressoa em cada coração seduzido pelo pecado. A conversão, restituindo-nos a inocência, traz com ela a saúde, o equilíbrio e a paz. O pecado desintegra a unidade da pessoa e desestrutura a personalidade, afetando a liberdade e a saúde mental. O pecado é inimigo da saúde. Uma boa consciência restabelece a saúde. A criança é símbolo desta inocência e integridade interior. É símbolo da consciência reta que preserva a cisão da personalidade, e possibilita relacionamentos sadios. Saudade da inocência significa, então, arrependimento, conversão, perdão, confissão dos pecados. É a conquista da unidade interior.

4. A primazia da ternura. Significa difundir uma “mística de não-violência”, pois sem a ternura a historia e o futuro serão cemitérios da nossa civilização. Sem ternura o útero materno será “matadouro de inocentes”, a mulher será objeto do homem, o sexo um egoísmo a dois, e o pobre, vitima do poder. Sem ternura é impossível conviver. Sem ternura a velhice será um estorvo e a eutanásia um alívio. Sem ternura resta-nos o apocalipse. Sem ternura o homem é lobo do homem. “Se não vos tornardes como crianças não entrareis no reino dos céus” (Mt 18, 3). “Amai-vos uns aos outros com amor terno e fraternal” (Rm 12, 10). A ternura de Deus restaura nossa inocência pelo perdão. A ternura tem poder de mudar o ódio em amor, a vingança em perdão. A ternura é o futuro do mundo.

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