Tornar-se como criança

Evangelho desafiante, Lucas 9, 51-62, o proclamado neste domingo. Começamos ouvindo o apóstolo Paulo reprovando o cristãos gálatas que não se comportavam como discípulos do Senhor. Recorda-lhes que foram “chamados à “liberdade”, porque na liberdade de Cristo saberão cumprir as obras do amor fraterno.

Conhecemos pouco o Senhor. A sua figura nos perturba. Sabemos que é um amigo difícil de compreender, por certo bom, mas ao mesmo tempo exigente. Sempre misterioso. É bom sentirmos o desejo de conhecê-lo melhor, para viver melhor a sua amizade. O Pai celeste no-lo mandou na terra para isso.

Os profetas foram enviados ao povo eleito como educadores na fé, para preparar a vinda do Messias. Começaram a revelar à humanidade o projeto de Deus sobre o homem, projeto de paternidade e de salvação, que encontrou sua plena revelação em Jesus. Deus nos ama, trata-nos como seus filhos, espera que em troca o tratemos com afeto e respeito como um pai. Preparou-nos na outra vida uma morada junto de si. A nós cabe aprender bem o projeto e vivê-lo, livres do mal, cumprindo com gratidão as obras da caridade.

Um projeto que nos deixa livres de aceitá-lo, de inserir-nos nele para vivê-lo com gratidão; mas igualmente livres e capazes de ignorá-lo, de recusá-lo e até de combatê-lo. Vejamos alguns exemplos de chamados por Deus e suas reações.

Eliseu, ao convite dirigido por Elias quando arava os campos com doze pares de bois, disse: “Vou abraçar meu pai e minha mãe, depois ti seguirei”. Fez um banquete para seus amigos. Matou um par dos bois e cozinhou a carne, fez fogo com os apetrechos para arar. Rompeu e deu adeus ao passado, começou nova vida de discípulo de Elias e de futuro profeta.

Os apóstolos, convidados pessoalmente por Jesus a segui-lo, deixaram os remos na barca e as barcas na margem, deixaram tudo ali, e tornaram-se os primeiros cristãos.

Ao invés, outros  também ouviram os ensinamentos do Senhor e responderam negativamente. De modo hostil, os samaritanos de quem falava o evangelho. Jesus passava por suas vilas, no meio deles, em direção a Jerusalém. Sempre em guerra com Jerusalém, um pouco racistas, não pararam nem mesmo para ouvir Jesus e o expulsaram.

Escribas e fariseus, não somente refutaram seguir Jesus, mas chegaram a levá-lo à morte. Esta é a terrível liberdade do homem.

Não é pois simples e pacífico colocar-se no seguimento de Jesus. Jesus não nos ilude. São Lucas no evangelho nos descreve três chamamentos de pessoas que se aproximaram do Senhor, declarando-lhe sua disponibilidade. Mas Jesus imediatamente os advertiu.

A um disse: “As raposas têm suas tocas, e os pássaros do céu seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde repousar sua cabeça”. Seguir Jesus exige escolhas radicais, pode comportar situações de precariedade, porque algum que vive destacado não agrada a todos, pode encontrar uma vida difícil. Para a corrupção ocorre estar em dois, quem paga e quem encaixa, e assim para tantas iniciativas para a delinquência. Quem é honesto com Deus pode encontrar-se em dificuldade com os homens.

A outro discípulo que quer organizar primeiro os seus negócios privados, Jesus diz: “Deixa que os mortos sepultem os seus mortos”. Jesus queria dizer que certa pessoas vivem como se fossem mortas. Quem pretende segui-lo deve estar pronto a colocar de lado também sentimentos e afetos legítimos, quando esses se tornassem obstáculo. É doloroso, mas às vezes necessário, se pretende colocar em primeiro lugar o Senhor.

Possíveis seguidores mostram sua saudade pelo que deixariam, a vida cômoda e pagã, e o Mestre corta: “Quem começou a segui-lo e depois olha para atrás, não está apto para o Reino de Deus”.

Portanto mesmo se todos somos chamados, não é fácil seguir Jesus.

Na escola de Jesus, Jesus desafia nossos cálculos e friezas de adultos. Ele mesmo nos disse: “Se não vos tornardes como crianças não entrareis no reino dos céus”. Na prática trata-se de adquirir, também em nossa idade, uma qualidade que é maravilhosa nas crianças: a simplicidade, a verdade, a curiosidade de ver o Senhor.

Cardeal Geraldo Majella Agnelo

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