Um povo marcado pela cruz

Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta

 

No caminho quaresmal nos é recordado que somos um povo marcado pela cruz. Os encontros preparados pelo Regional Sul 3, para todas as Dioceses do Rio Grande do Sul, são motivados por esta perspectiva: “Junto à cruz, há esperança”. Ela nos ajuda a vivermos a fé com realismo, olhando para as cruzes que estão presentes na nossa vida e na vida do nosso povo, como nos pede a Campanha da Fraternidade. Também nos aponta para a esperança que é um raio de luz que parte da ressurreição. É com a certeza do Cristo vivo e ressuscitado que contemplamos o Crucificado.

A Sagrada Escritura nos fala do povo de Deus, que durante a perseguição do faraó, no Egito, as portas das casas foram marcadas (cf. Ex 12,23) para que nenhum mal os atingisse. Era a marca da pertença ao povo e da proteção de Deus. No final da Sagrada Escritura, no livro do Apocalipse, estão presentes os que foram salvos pelo sangue do Cordeiro, marcados com o selo do Deus vivo (cf. Ap 7,3). Na liturgia da Igreja, a assinalação com a cruz faz parte dos ritos de iniciação cristã. É o sinal distintivo do cristão, para que “seguindo os passos de Cristo, conservem em sua vida a graça da vitória da cruz e a manifestem por palavras e gestos” (RICA). Ao fixarmos na porta de nossa casa a cruz de Cristo manifestamos publicamente nossa pertença à comunidade dos cristãos e nos dispomos a um caminho interior de conversão e renovação do nosso batismo em vista da celebração da Páscoa. Obviamente o essencial é o interior da família, seu convívio e a vida de cada membro, no desejo de crescer na santidade, mas não menos importante é o sinal exterior, que indica, numa sociedade cada vez mais secularizada, a presença de quem crê.

Contemplar o crucificado tem o objetivo de internalizar as atitudes que moveram o Servo Sofredor (cf. Is 53,1-6) no seu amor e fidelidade até o fim. A cruz de Cristo em nossas casas e na nossa vida não quer trazer tristeza e sofrimento, mas nos recordar sempre da alegria, pois “por suas chagas nós fomos curados” (Is 53,5), manifestando a misericórdia e o perdão que supera todo pecado. Mas, também, indica a necessidade de fidelidade do batizado no seguimento de Cristo. Não é possível ser cristão morno, pois disse Jesus: “Se alguém quer ser meu discípulo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mt 16,24).

Mas, sem dúvidas, é impossível olhar para o Crucificado e não vermos as cruzes de hoje. A cruz de Jesus se prolonga hoje “no grito sufocado das crianças impedidas de nascer e daquelas que não têm o direito de ter uma infância, uma família, uma instrução; que não podem brincar, cantar e sonhar; nas mulheres maltratadas, exploradas e abandonadas, despojadas e ignoradas na sua dignidade; nos olhos tristes dos jovens que veem suas esperanças de futuro serem arrebatadas por falta de instrução e trabalho digno; na angústia de rostos jovens que caem nas redes de pessoas sem escrúpulos, redes de exploração, criminalidade e abuso que se alimentam de suas vidas” (Papa Francisco, JMJ Panamá, 25/01/2019).

Qual será nossa atitude diante do “selo de Deus” que recebemos no batismo e da cruz que marcamos a porta de nossas casas? Peçamos a Deus que nos livre da indiferença. “Queremos ser uma Igreja que apoia e acompanha, que sabe dizer: estou aqui, na vida e nas cruzes de tantos cristos que caminham ao nosso lado” (Francisco, 25/01/2019).

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