Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ
A liturgia do 4º. Domingo da Quaresma vem para nos fortalecer ainda mais nesta grande caminhada do tempo quaresmal. Conhecido como Domingo Laetare, ou Domingo da Alegria; embora ainda o caminho quaresmal não tenha chegado ao seu termo, o Senhor nos renova o ânimo para a caminhada, de modo que a alegria da Páscoa começa a ser vislumbrada. A Liturgia deste domingo nos coloca nestas temáticas importantes: a unção, a cura do cego e a luz.
A primeira leitura deste domingo, é do livro de Samuel (cf. 1Sm 16,1b.6-7.10-13a). Nela lemos que Deus escolhe Davi, filho de Jessé, para ser ungido como Rei do povo de Deus. É Davi o filho escolhido e o herdeiro da aliança.
A Segunda Leitura (cf. Ef 5,8-14) ensina que: “Outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor Vivei como filhos da luz. E o fruto da luz chama-se: bondade, justiça, verdade”. (v.8-9). Eis o convite que o Apóstolo faz a todos nós, que vivamos na Luz do Senhor. Que possamos dissipar das trevas e encontrar o Senhor que é a luz do mundo.
O Evangelho do Domingo Laetare (cf. João 9, 1-41) vemos se concretizar mais uma das catequeses batismais proposta pelo Evangelho de João. As três grandes “catequeses batismais” do Evangelho de João que norteiam a liturgia na Quaresma são a história da Samaritana (Jo 4), a do cego de nascença (Jo 9) e a de Lázaro (Jo 11). Vemos no Evangelho a perícope que fala do cego de nascença, pois, esta é uma história muito bem escrita.
Na perícope, vemos: um cego que está sentado, mendigando, do lado de fora do Templo (os cegos e coxos eram proibidos de entrar no Templo:
2Sm 5,8). Jesus passa, faz lama com a saliva, pega esta lama e passa nos olhos do cego e depois o manda ir ao tanque de Siloé, a 1km dali. (O evangelista explica que Siloé significa “enviado”, termo com o qual Jesus pediu se designa a si mesmo: (Jo 9,7). O cego executa o que Jesus pediu e volta vendo.
Começam então os comentários. Há quem não acredita nos próprios olhos: “será aquele que vivia mendigando na porta do templo? Não pode! Deve ser outro”. Mas o cego confirma: “Sou eu mesmo” (Jo 9,9). E quando perguntaram como ficou vendo, explica direitinho o que Jesus fez e lhe mandou fazer (Jo 9,11).
O milagre da cura do cego, havia acontecido em um dia de sábado. Devido a isso, os especialistas da religião concluem que Jesus realizou uma heresia, pois, não podia ter feito este ato de curar em dia de sábado, pois, este dia é sagrado. O cego diz que Jesus é um profeta. Chamam então, os pais do cego para dizer que ele nunca foi cego e muito menos curado da cegueira. Mas os pais não querem ser excluídos da comunidade e dizem que o cego pode responder por si (Jo 9, 17-22).
Uma outra indagação é feita ao cego (Jo 9,24), para que ele negue a Jesus. Ironicamente, o cego vai responder que a única coisa que ele sabe que era cego e agora está vendo. Os fariseus o interrogam novamente para saber que Jesus fez lama em dia de sábado. Mas o cego responde: “querem ouvir mais uma vez? Vocês também querem se tornar seus discípulos? (Jo 9,27). E, finalmente, quando ele insiste que Jesus fez com a ajuda de Deus um milagre como nunca se viu, excluem-no da sinagoga (Jo 9,34).
Por um lado, Jesus encontra o ex-cego no Templo (pois agora que ele não é mais cego, pode entrar no Templo, ainda que excluído da Sinagoga). Jesus lhe pergunta se ele tem fé no Filho-do-Homem (nome bíblico do
enviado de Deus). O ex-cego responde: “quem é, para que eu acredite nele?” (ele reconheceu Jesus, pois quando se encontraram ele estava ainda cego). Jesus retrucava: “já o viste: é aquele que está falando contigo”. Para isso mesmo é que seus olhos foram abertos! Mas ele vê não somente com os olhos, ele vê também com o coração! Cai de joelhos e exclama: “Creio, Senhor” (Jo 9,38).
Por outro lado, Jesus diz: “Vim ao mundo para um julgamento, a fim de que os que não estavam vendo vejam, e os que vêem se tornem cegos” (Jo 9,40). Os fariseus ouvem isso e percebem que Jesus diz isso para eles. “Então, nós é que somos cegos?”, perguntaram. Mas, com fineza extrema, Jesus responde: “Se vocês fossem cegos, até que não seriam culpados. Mas agora que dizem que vêem, o pecado de vocês se confirma” … (Jo 9,41).
O milagre de Jesus, ilustra sua frase: “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8,12; 9,5). Depois de termos meditado esta sagrada liturgia, queremos pedir ao Senhor que também nos cure de nossas cegueiras espirituais e materiais. Jesus é a Luz que brilha em meio às trevas, caminha conosco e nos leva para caminhos seguros e iluminados. Jesus é o Bom Pastor! Que Deus abra os nossos olhos para que assim possamos enxergar a Luz de Cristo e assim ao termos contato com essa “Luz”, possamos também ser para o outro “luz do mundo”.