Dom Walmor Oliveira de Azevedo
A razão da realização da Vigília pela vida nascente nas Igrejas do mundo inteiro – convocada recentemente pelo Papa Bento XVI – está no centro do horizonte da sociedade contemporânea, desafiada diante de uma nova necessidade de sentido para a vida. A questão do sentido é desafiadora porque não se vale materialmente em si. Sua falta revela-se no esgarçarmento da cultura que sustenta a vida, ameaçada em todas as suas dimensões e direções em todo o planeta Terra.
Vida, morte e atividades humanas exigem clareza a respeito do significado que têm. São questões que não se explicam unicamente no âmbito do progresso científico e tecnológico. Em questão está a pergunta acerca da aventura humana de compreender seu sentido e seu destino.
A Igreja, por missão recebida de seu mestre e senhor, Jesus Cristo, sabe e deve ajudar cada ser humano a descobrir Deus – significado último da existência. Tarefa árdua. Em meio a tantos apelos, a Igreja sabe que só Deus responde as aspirações mais profundas do coração humano. Quando o homem contemporâneo não alcança essa meta, sua vida se resume a um horizonte estreito, destituído de valores. Assim, a cultura se enfraquece e dá lugar à violência, à falta de solidariedade e de sensibilidade social.
A perda dos valores produz a decomposição da cultura que sustenta o tecido da vida. Falta-lhe a consistência indispensável que só vem da moral articulada pela força de valores éticos e de princípios inegociáveis. O caos se instala facilmente comprometendo condutas individuais que, por sua vez, comprometem contextos culturais que precisarão de longo tempo para voltar a defender e promover o dom da vida. Assiste-se, então, lamentavelmente, a instalação da cultura da violência, da desordem, da corrupção, da traficância de todo tipo.
Esgarçar uma cultura pela perda de valores é muito mais rápido do que retificá-la com a absorção, a obediência e a vivência desses mesmos valores. Essa tarefa, incluída na missão da Igreja, razão que faz o Papa levantar a voz com uma decisiva convocação há de ser assumida com urgência por diferentes segmentos da sociedade. Culturas comprometidas por violência, droga, corrupção retardam providências para que seja restaurada a moralidade, e recuperados os princípios e valores éticos. A situação da atual sociedade é deplorável, pois justifica respostas de ontem deixando-as para o amanhã, atrasando processos e comprometendo a solidariedade. Falar, promover e educar não pode, absolutamente, ser considerado um atentado à liberdade e à autonomia, direitos insubstituíveis no contexto pós-moderno.
A liberdade e a autonomia precisam respeitar e obedecer a princípios e valores, para que, de fato, sejam sustentáculos da vida. É preciso, mesmo que aos poucos, com coragem e destemor, conscientizar a todos que “A vida é presente gratuito de Deus, dom e tarefa que devemos cuidar desde a concepção, em todas as suas etapas, até a morte natural, sem relativismos”, conforme afirma o Documento de Aparecida.
“A liberalização e banalização das práticas abortivas são crimes abomináveis, como também a eutanásia, a manipulação genética e embrionária, ensaios médicos contrários à ética, a pena de morte e tantas outras maneiras de atentar contra a dignidade e a vida do ser humano” (DA) – esta afirmação dos bispos chama a atenção de todos para o desafio do diálogo entre a fé, a razão e as ciências. Esse caminho é exigente e requer boa vontade e superação de todo tipo de preconceito. Não se pode desejar a vida, a paz, a fraternidade e a felicidade sob a lógica do lucro e da eficácia.
É urgente a superação da indiferença diante do sofrimento alheio e dos ataques à vida – desde a fase intrauterina até a que configura exclusão social. A vida depende, na sua sustentabilidade e sentido, da cultura edificada sobre valores e princípios advindos da ética e da moral.