Artigo do arcebispo de Passo Fundo fala sobre “jeitinho brasileiro”

A primeira edição do livro “Crítica da Razão Tupiniquim” do professor Roberto Gomes chegou ao público em 1977. Segundo o arcebispo de Passo Fundo (RS), dom Rodolfo Luís Weber, o projeto do livro é pensar a “Razão Brasileira”, isto é “pensar o que se é, como se é”. Dom Luís Weber aponta que, desde a primeira edição do livro até hoje, houve alterações no modo de pensar brasileiro, porém muitas das instituições permanecem atuais.

O livro foi inclusive o ponto de partida para o arcebispo escrever o artigo intitulado “A gente dá um jeito”, baseado no mito da concórdia do brasileiro de que tudo “se dá um jeito”. No texto, o bispo afirma que a sociedade tem leis e normas que regulamentam a convivência e o funcionamento social, mas que isso soa como formalismo, legalismo: “Eu sei que esta é a regra, mas não dá para dar um jeito”? “Seu guarda, eu sei que infringi a norma de trânsito, mas porque me multar”?

Destes pequenos jeitos, dom Luís Weber afirma que se chega aos milionários que resultam em grandes corrupções. “As normas são estas, mas para mim ou para aquele grupo são diferentes”, diz em um trecho. O arcebispo também comenta que hoje em dia temos inúmeras regras de fiscalização, seja por legislação ou norma interna, nos processos licitatórios com objetivo de prevenir desvios. Ele cita ainda que vários tribunais analisam os contratos e seu cumprimento e que múltiplos documentos são exigidos. “Com todo o aparato burocrático, a corrupção não diminuiu”, acrescenta.

Em seu artigo, dom Luís Weber concorda com o que diz o professor Roberto Gomes em seu livro – de que o “jeitinho brasileiro” traz efeitos colaterais sérios. Um deles seria a desconfiança. “Quem está falando comigo está sendo transparente? É isto mesmo que quer dizer?”, diz em um trecho.

“Da desconfiança nasce a burocracia”, afirma o bispo. Para ele, múltiplas exigências, muitas descabidas, acrescidas de morosidade, para impedir a transgressão da regra, para controlar o jeitinho. “Para provar que ‘eu sou eu’ preciso de uma série de documentos, repetidos, carimbados para dizer a mesma coisa. Constantemente é preciso provar a minha veracidade e que sou eu mesmo”, garante no artigo.

“Ouvimos com frequência as pessoas reconhecerem que temos muitas e boas leis. Se fossem cumpridas a vida seria mais fácil e tudo funcionaria melhor. O cumprimento das leis, portanto, não pode ser compreendido como formalismo ou legalismo. Seu cumprimento é o respeito aos valores fundamentais da sociedade. O jeito é uma maneira marota de desrespeito aos valores maiores”, finaliza o bispo no artigo.

Tags:

leia também