Dom Aloísio Alberto Dilli
Bispo de Santa Cruz do Sul (RS)
Caros diocesanos. Continuamos a celebrar o Tempo pascal na liturgia da Igreja, o qual se prolonga até Pentecostes. Antes, porém, da vinda do Espírito Santo, Jesus subiu aos céus, mistério que celebramos na solenidade da Ascensão do Senhor. Os textos bíblicos deste fato, ocorrido 40 dias depois da ressurreição, se relacionam com a missão dos discípulos de continuar o anúncio da Boa Nova de Jesus por todos os tempos (Cf. Mc 16, 15-20; At 1, 1-11).
Para compreender o sentido da solenidade da Ascensão do Senhor é preciso ir muito além de uma imaginação cênica da subida do Senhor entre as nuvens e voltando aos céus, como fato separado da vida de Jesus. É necessário relacionar a Ascensão com o mistério da Encarnação de Jesus Cristo. Na linguagem litúrgico-celebrativa de ambas (Oração sobre as Oferendas) encontramos a expressão: “troca ou comunhão de dons entre o céu e a terra”. Na reflexão teológico-litúrgica, em Jesus Cristo encarnado se revela um Deus que desce ao encontro da pessoa humana, sua criatura e objeto de seu amor. Esse verbo descer (ser servo: lava-pés) mostra como a iniciativa de Deus coloca seu coração junto à miséria humana (miséria + coração = misericórdia) para redimi-la e renovar a aliança rompida: é o encontro do divino com o humano (encarnação) para que este possa entrar em comunhão com a divindade e ser salvo.
Qual é então o sentido da Ascensão do Senhor? O mesmo Jesus, o “Verbo que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 14), que desceu do seio da Trindade ao nosso encontro, agora, na Ascensão, toma o movimento inverso: sobe aos céus, elevando junto com ele nossa humanidade. Por isso exulta e louva o Prefácio I da Ascensão: “Ele, nossa cabeça e princípio, subiu aos céus, não para afastar-se de nossa humildade, mas para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade”; e o Prefácio II completa: “Ele subiu aos céus, a fim de nos tornar participantes da sua divindade”. Por isso a Igreja reza: “Ó Deus todo-poderoso, a ascensão do vosso Filho já é nossa vitória. Fazei-nos exultar de alegria e fervorosa ação de graças, pois, membros de seu corpo, somos chamados na esperança a participar da sua glória” (Oração do Dia).
Os textos litúrgicos da Ascensão revelam uma teologia que aponta para o valor extraordinário da nossa vida: fomos criados para sermos eternos. Lembra o Prefácio III do Natal: “No momento em que vosso Filho assume nossa fraqueza, a natureza humana recebe uma incomparável dignidade: ao tornar-se um de nós, nós nos tornamos eternos”. A Igreja celebra a Ascensão do Senhor com alegria, pois Jesus Cristo, à direita do Pai, já representa nossa humanidade. Na esperança, já participamos de sua glória. A Igreja une-se ao Senhor que permanece conosco até o fim dos tempos e está também nos céus, não se afastando de nossa humanidade, mas elevando-a para junto do Pai, tornando-se Mediador e atraindo-nos para a realidade celestial.
A celebração deste mistério nos conforta, sobretudo em tempos de crise, como a pandemia, quando tantas apreensões e sofrimentos se avizinham de todos nós. A dimensão da esperança, tão necessária em nossa identidade humana, é fortificada ao celebrarmos a Ascensão, pois ela aponta para a dimensão eterna da nossa vida, mesmo tendo que passar pela morte humana, que tanto nos entristece. O Senhor, que prometeu estar conosco todos os dias, até o fim do mundo (cf. Mt 28, 20), nos acompanhe, fortifique nossa fé e esperança, pois quem crê tem futuro (cf. Bento XVI).