A caminhada da Pastoral Afro-Brasileira

A pastoral afro-brasileira é uma boa notícia construída ao longo de muitos anos, através do esforço dos diferentes agentes de pastoral católicos que, em nome da sua fé, procuraram encontrar espaços de atuação e testemunho na vida e na missão da Igreja. Neste caminho os agentes tinham a certeza da sua pertença a uma Igreja, a uma comunidade de fé. Tinham também a convicção da pertença a um grupo cultural: os afro-brasileiros. Através deste texto o leitor terá um breve histórico da presença dos afro-brasileiros nesta nação e da sua atuação na Igreja. No encontro com a fé cristã, apesar da sombra do escravismo, os negros e negras brasileiros foram aprendendo o sentido da pertença à Igreja católica. A partir do sentido de pertença perceberam a necessidade de contribuir com a Igreja com os valores e riquezas da tradição africana. Estava preparado o caminho para a estruturação da pastoral afro-brasileira que hoje é significativa para os negros e negras católicos.

O texto que segue traz presente um breve histórico da presença dos negros no Brasil. A seguir enfocará a relação deste povo com a Igreja Católica. Por fim será descrita a iniciativa de estruturar um trabalho pastoral voltado especificamente aos afro-brasileiros, o que culminará com a criação da pastoral afro-brasileira.

Neste caminhar muitas sementes foram lançadas, muitos frutos foram colhidos. Contudo, continuam sendo de suma importância o apoio e incentivo, de parte de toda a Igreja, às iniciativas dos diversos agentes de pastoral negros que vivem a sua experiência de fé nas tantas comunidades espalhadas pelo Brasil. Eles têm uma história, são diferentes, mas proclamam a mesma fé.

1- Histórico

A História dos afro-brasileiros convida a todos para uma reflexão cada vez mais oportuna e necessária sobre a presença deste grupo em terras brasileiras, por ter sido um povo que contribuiu significativamente com a estruturação sócio, político, econômico e cultural da nação.

A decisão de povoar as terras brasileiras e de dar um passo além do extrativismo, característica dos primeiros anos da colonização, implicou em uma outra decisão, trazer os povos africanos para assumirem o trabalho nas lavouras de cana de açúcar e no aparato que esta exigia[1].

O passado dos afro-brasileiros pode ser compreendido a partir de três vertentes: a primeira refere-se ao processo escravagista, a chamada escravidão moderna que era diferente da escravidão de acento tribal. A escravidão moderna se intensificou no século XVII e proporcionou uma transformação radical no continente africano. Os países africanos, que perderam seus membros para as lavouras do novo mundo, até hoje se ressentem desta ferida aberta[2]. Perderam o que era a sua maior riqueza, a sua gente[3]. Os que foram forçados a deixarem as terras africanas, além de perderam a referência estruturante de suas vidas: a terra, o povo, os costumes, a tradição religiosa, chegaram ao exílio como não-gente e não-cidadãos. A lei estava do lado do Senhor do Engenho. Lutar pela a liberdade significava ir contra a lei. Daí a escravidão moderna ser lida como uma das chagas que marcaram o início do ciclo econômico do Brasil no período colonial e imperial. Foram três séculos de experiência escravocrata[4].

A segunda vertente diz respeito ao fato da abolição da escravatura. Não há dúvidas sobre as intenções abolicionistas de muitas pessoas ligadas ao Segundo Império[5]. Mas também se compreende que a “abolição” respondia a uma exigência da economia mundial, exigência esta que o Brasil já demorava a atender. Nesse caso desconfia-se de uma abolição de fundo eminentemente altruísta.

Além dos motivos da “abolição”[6], que não serão expostos neste texto, é conveniente compreender as conseqüências que ela trouxe para os negros que se tornaram ex-escravos. Não foram criadas condições na sociedade para absorção dos negros que deixavam as lavouras com as quais seus ex-senhores não tinham mais nenhuma forma de compromisso. As leis anteriores: “ventre-livre” e “sexagenária”, já geraram excluídos, pois não havia uma política de inclusão desses grupos, primeiramente as crianças e idosos e depois todos os alforriados pela Lei Áurea.Os negros “libertos” se viram diante de uma sociedade despreparada para acolhê-los e desprotegidos quanto a políticas de inclusão social.

A ideologia que deu sustentação ao escravismo no passado, impediu aos negros a oportunidade de viverem como cidadãos da nação brasileira. Ela tornou natural o preconceito e a discriminação que são realidades anti-humanas, anti-naturais e, conseqüentemente, anti-evangélicas. No que diz respeito à economia, os grupos negros se configuraram como reserva de mão de obra ou como executores de ofícios desprestigiados aos olhos da população de origem européia.

As disparidades entre a população negra e a branca no acesso à educação, emprego, padrão salarial, moradia e outras necessidades fundamentais, são conseqüências do processo histórico secular de negação de oportunidades aos afro-brasileiros[7] de exercício da cidadania. Os negros tiveram que aprender muito sobre deveres, mas pouco sabem e pouco são informados sobre direitos.

A terceira vertente diz respeito à resistência da população negra[8]. Os negros não aceitaram passivamente a escravidão. No tempo do escravagismo os “quilombos” eram construídos como um espaço de resistência ao modelo escravista. Mas também a dança, a religiosidade, a cultura, ajudavam a suportar os reveses e manter viva a dignidade e o sentido da vida. No tempo pós-abolição, o espaço do “morro”, as confrarias, as irmandades, a comunidade, compreendidos como “quilombos modernos”, eram o lugar da sobrevivência, da acolhida aos maltratados pela sociedade.

Hoje, por trás das manifestações da cultura africana, habitando os espaços geográficos urbanos, encontra-se a “santa teimosia” em resistir e buscar caminhos de sobrevivência em um ambiente social hostil que ainda não aceita e acolhe os afro-brasileiros[9]. A resistência da sociedade é relevada pela acolhida e aconchego dos novos quilombos das cidades. Estas experiências de resistência têm ajudado os negros a compreenderem o valor do seu lugar em uma pátria que ainda não é a sua pátria, pois ainda estão em busca da cidadania plena.

Contudo, a caminhada árida da população afro-brasileira, desde o período colonial, não diminui o significado das contribuições dadas por este grupo para a consolidação de um povo formado por diferentes etnias. Este é o retrato do retrato do Brasil.

Em termos de economia foram três séculos de suor e esforço nas lavouras de cana e café, na mineração e nos diferentes ofícios geradores de riqueza e renda. A presença na economia permitiu a participação em outras dimensões da vida brasileira tais como a música, a alimentação, a leitura, a visão de mundo, a religiosidade e o jeito de celebrar e viver a fé[10]. Mesmo que o advento da escravidão tenha significado uma violência em relação ao povo negro, esta não impediu que os afro-brasileiros, pela sua dinamicidade e resistência, impregnassem de valores o solo brasileiro, não só pelo suor e o sangue, mas também pela riqueza cultural, o que também influenciou a vida eclesial[11].

2- Os negros e a Igreja

Escrever sobre os afro-brasileiros presentes na Igreja implica em fazer a recordação da história dos negros do Brasil. Esta é a razão da memória antes mencionada.

A sociedade que fez a opção econômica pelo escravagismo buscou um sólido conjunto de justificativas para tal orientação. As justificativas da escravidão, de origem filosófica, biológica e até mesmo teológica, geraram uma orientação preconceituosa e discriminatória em relação à cultura dos povos oriundos da África.

A Igreja encontrou dificuldades em apontar um outro caminho. O projeto colonial embasado na economia escravagista foi hegemônico. Não teria durado três séculos se tivesse enfrentado uma resistência mais consistente. A Igreja não o questionou de uma forma incisiva[12] e em diversas situações compactuou com a escravidão[13]. Um exemplo desta dificuldade: ainda hoje há poucas vocações sacerdotais e religiosas oriundas da cultura afro-brasileira. Há uma causa histórica para esta dificuldade[14]. Não há como negar certo estranhamento entre os afro-brasileiros e a Igreja, mesmo que os negros tenham sido os primeiros batizados do continente latino-americano e do Brasil [15].

Entretanto, se percebe, no passado e hoje, muitas iniciativas de apoio, reconhecimento e solidariedade à caminhada dos negros em terras brasileiras. Tais iniciativas estão em sintonia com compromisso do missionário Pedro Claver, o santo que se fez negro no meio dos negros. O próprio Zumbi dos Palmares foi acolhido por um padre que o educou até a juventude. Os Franciscanos do Rio de Janeiro[16] acolhiam escravos idosos impossibilitados de trabalhar. Ao menos tinham uma morte digna. Muitos bispos e padres, ao seu modo, procuraram ajudar os negros e negras escravizados. Vê-se que Igreja procurou arrefecer, mesmo sem o questionar de forma incisiva, o impacto do projeto escravagista sobre os negros. As iniciativas de apoio aos negros foram constantes.

No século passado a Conferência de Puebla (1979) sugeria à Igreja o compromisso para com os negros, pois ali era visto também o rosto de Cristo sofredor[17]. A Conferência de Santo Domingo (1992), com atenção especial voltada às culturas presentes no Continente Latino Americano, dedicou atenção à situação dos afro-americanos[18]. O documento Ecclesia in América também reforça o compromisso para com os afro-americanos e sugere o desafio da formação de agentes de pastoral competentes capazes de fazer uso de métodos já legitimamente inculturados na catequese e na liturgia. Tal orientação também faz referência aos povos indígenas[19].

Com o dizia o profeta Isaías (Is11, 1s), há um broto nascendo e que nos faz acreditar na vida. No caso dos afro-brasileiros existiram muitos brotos. Estes brotos, porque cuidados e amados, geraram plantas, projetos, deram um aporte para a cidadania civil e eclesial reivindicadas pelos negros[20]. As Conferências de Medellín em 1968, Puebla em 1979, Santo Domingo em 1992 e mais recentemente Aparecida, aconteceram pelo sopro do Espírito, iluminaram o compromisso efetivo da Igreja como o povo latino americano. Este compromisso foi assumido também em relação ao povo negro e permanece no horizonte evangelizador da Igreja[21]. Era o alimento necessário para os brotos que surgiam, a renovação diversa e ampla como inspirou o Espírito Santo (At 2, 1ss).

A Campanha da Fraternidade de 1988 foi um referencial importante nesta caminhada. Respondeu aos anseios da comunidade negra católica e significou uma nova forma de relação. Viu-se que nas comunidades havia uma presença significativa da população negra. Muitos agentes de pastoral e lideranças diversas eram descendentes de africanos. Para isto fazia-se necessário o despojamento dos preconceitos e atitudes discriminatórias que também estavam nas lideranças, nos padres, nos religiosos e religiosas. O convite à conversão feito por João Batista à população da Palestina (Mt 3,2) foi feito também pelos negros à Igreja Católica nas suas diferentes comunidades. No caso, a conversão implica no reconhecimento da alteridade, a presença diferente, não menos cristã e comprometida com o Reino, apenas diferente[22].

Ainda hoje colhemos os frutos deste “ano da graça” para a Igreja e para o povo negro. Permanece o desafio de continuar a abertura à cultura e a riqueza do povo negro[23]. Uma abertura que fará da Igreja mais plural e mais profética, pois é companheira na luta pela cidadania plena[24]. A Igreja, desde seus primórdios, não é formada por uma só cultura, é pluri-etnica. É sempre desafiada a enriquecer-se, mais ainda, acolhendo os dons e a riqueza da cultura afro-brasileira. Convoca seus membros a estar a serviço do povo de Deus, em comunhão com toda a humanidade, sem exclusão, buscando a libertação, à caminho do Reino definitivo.

Em comunhão com a missão da Igreja no Brasil os afro-brasileiros assumem as Diretrizes e as Linhas de Ação, contribuindo com a ação evangelizadora na inculturação do Evangelho. Cremos na presença do Espírito Santo, protagonista primordial da evangelização. O sopro divino abre caminho neste projeto justo e necessário.

A Igreja no Brasil, a partir de uma releitura histórica e profética assume um compromisso alvissareiro: “promover os valores culturais do povo afro-brasileiro e a sua religiosidade, respeitando a sua forma de ser e agir”.

As iniciativas abaixo descritas revelam a concretude deste compromisso que se aprofunda.

3- A Pastoral afro-brasileira

A pastoral afro-brasileira nasceu da necessidade de dar uma organicidade as diferentes iniciativas dos negros católicos que marcam presença na vida e missão da Igreja. Também é fruto da consciência das necessidades que vão surgindo a partir do aprofundamento do compromisso com a caminhada das comunidades negras. A pastoral é compreendida como zelo apostólico para como o povo, sobretudo para com os povos pobres e os abandonados. Assim, as diversas iniciativas dos negros católicos encontram na pastoral afro-brasileira um espaço de reflexão, articulação e diálogo voltados para a vivacidade e dinamicidade da ação evangelizadora da Igreja[25]. A pastoral afro-brasileira integra a Comissão Episcopal para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz e as demais Pastorais Sociais da CNBB e tem um Bispo como referencial. Existem outros grupos de ação que estão ligados à pastoral afro-brasileira. Vejamos:

3.1- Agentes de pastoral negros – APNS

Na diversidade da experiência cristã católica a Igreja vai sendo enriquecida pela contribuição dos afro-brasileiros. Desde a década de oitenta vem acontecendo a caminhada dos APNS – agentes de pastoral negros – são leigos e leigas que vivem o compromisso de batizados prestando serviço nas diferentes ações da Igreja. Organizaram-se como agentes negros não a partir de uma perspectiva sectária, mas para aprofundarem a sua pertença à Igreja como membros de uma tradição que é milenar. Para estes agentes, ser negro e ser católico não é contradição, mas enriquecimento e compromisso cristão. Outra característica dos apns é a sua atuação nos diversos setores da sociedade[26], o que sugere o diálogo ecumênico e o diálogo com outras entidades da sociedade civil que tem um compromisso para com o povo negro em geral. Os apns têm uma equipe de coordenação nacional. Nos regionais e estados também existem organizações que buscam assumir a mesma perspectiva de ação evangelizadora através da experiência cultural africana. Respondem aos compromissos das Dioceses e Regionais. Aqui se inserem também aqueles negros e negras que fazem parte das Irmandades, Confrarias, Congados, as formas específicas de viver a fé católica. Este grupo celebra, em 2008, 25 anos de caminhada.

3.2– Grupo de religiosos e religiosas negros e indígenas – GRENI

Esta organização está ligada à caminhada da CRB – Conferência dos Religiosos do Brasil. É uma organização ligada à vida da Igreja e assume a especificidade de enriquecer a mística e espiritualidade da vida religiosa com os elementos próprios das tradições indígenas e africanas. Neste sentido o Greni tem sido um espaço de incentivo, sobretudo das culturas de origem africana, visando a uma melhor acolhida e a uma maior presença de afro- descendentes nas comunidades religiosas[27].

3.3 – Articulação de Bispos, Presbíteros e Diáconos Negros – Instituto Mariama

A caminhada dos bispos, padres e diáconos negros começou em 1988. O Instituto Mariama é a entidade que representa oficialmente esta articulação de alcance nacional. Tem entre as suas finalidades colaborar para com a formação dos agentes de pastoral negros, em especial dos bispos, presbíteros e diáconos negros católicos do Brasil para que sejam solidários possam estar presentes em meio à população mais fragilizada, contribuindo para a formação integral de crianças, jovens e adultos[28]. O encontro anual do Instituto Mariama acontece a cada ano em uma cidade diferente. Comumente o encontro é dividido em um momento de estudo de temática ligada ao ministério presbiteral e à caminhada da Igreja. Também é reservado um dia para o recolhimento na perspectiva em aprofundar a mística e a espiritualidade do presbítero negro. Nestes encontros refletimos a caminhada do Instituto e sua missão junto à Igreja e aos irmãos e irmãs afro-brasileiros.

3.4 – Grupo Atabaque – Cultura Negra e Teologia

O grupo Atabaque é formado por teólogos e outros intelectuais que se propõem a refletir as questões de negritude ligadas à teologia. É um grupo ecumênico. Sua sede situa-se em São Paulo. Tem prestado uma significativa contribuição em termos de reflexão da cultura negra na sua relação com a teologia.

3.5- Congresso Nacional das Entidades Negras Católicas – CONENC

Este congresso acontece a cada dois anos. Tem amplitude nacional e conta com representantes dos regionais da CNBB. O último Congresso aconteceu na cidade de Salvador. Tema: Pastoral afro-brasileira: identidade e missão. Lema: Mais negros (as), mais missionários (as).

3.6- Encontro de Pastoral Afro-Americana e Caribenha -EPA

Este encontro acontece de três em três anos congregando os agentes de pastoral do Continente Latino Americano e Caribe. O último encontro aconteceu em novembro de 2006 na Venezuela. O tema de reflexão foi a situação da juventude negra latino americana e caribenha. O próximo acontecerá em 2009 no Panamá. É convocado e coordenado pela Secretaria de Pastoral Afro-Continental do CELAM (SEPAFRO-CELAM)

Estas diferentes instâncias de participação, no Brasil e no continente latino americano têm ajudado significativamente os negros e negras católicos a compreenderem o valor do seu espaço na vida da Igreja. É importante, na comunidade, e tem seu valor nos outros espaços de vida eclesial. Destas iniciativas pastorais nasceram e foram se estruturando diferentes grupos específicos que tem atuado de forma efetiva nos diferentes espaços.

4- Contribuição da Pastoral Afro-brasileira da CNBB

Completando vinte anos de existência a pastoral afro-brasileira, assumida pela CNBB como um setor próprio, reconhece o protagonismo dos afro-brasileiros na História da Igreja no Brasil. A experiência está sendo maravilhosa e já tem gerado alguns avanços significativos:

  1. o nível de consciência do Ser pessoa e pessoa negra, assumindo as raízes étnicas e culturais;
  2. o desenvolvimento do senso crítico nos aspectos social, político, religioso e cultural;
  3. a solidariedade entre os grupos negros e não negros, intensificando o diálogo religioso no macro ecumenismo;
  4. a existência do GRT – grupo de reflexão teológica;
  5. a instalação do secretariado de pastoral afro-brasileira na CNBB com a ajuda significativa da CRB nacional;
  6. a realização do CONENC – Congresso Nacional das Entidades Negras Católicas.

A realidade social nos desafia ao anúncio da Boa Notícia, nesta sociedade onde impera a violência, o desemprego, a fome, o analfabetismo, a perda da identidade, tendo como resultado a exclusão, a esperança ameaçada. As vítimas desta realidade difícil, em sua maioria são os negros. Acreditamos teimosamente na concretização do sonho de uma sociedade livre, sem escravos e nem senhores, para que se possa reconstruir o Quilombo Páscoa, onde todos são tratados com igualdade, onde todos participam. O Projeto da pastoral afro-brasileira é uma proposta de construção da cidadania plena para todos.

5- Desafios à Pastoral Afro-Brasileira

5.1- Fomentar e fortalecer os grupos de base nas comunidades. O melhor caminho da evangelização é o compromisso missionário dos negros e negras que assumem seu compromisso de batizados.

5.2- Incentivar a solidariedade e o diálogo com as instâncias da sociedade civil que representam o povo negro e outros grupos solidários que lutam e se comprometem com a recuperação da dignidade dos afro-brasileiros. A luta pela cidadania é ainda um desafio presente.

5.3- Vivenciar a liturgia das comunidades com espírito cristão e evangelizador. A liturgia é sempre de louvor, oração e celebração da vida. A seriedade e sobriedade na preparação é compromisso de todos nós.

5.4- Assumir os desafios que a Conferência de Aparecida propõe para a Igreja especialmente o Projeto da Missão Continental.

5.5- Incentivar as vocações sacerdotais e religiosas que acenam para uma perspectiva mais diversa de vida eclesial[29].

6- Importância da contribuição do Episcopado Brasileiro

A Conferência de Aparecida, no seguimento das Conferências anteriores, reforçou a necessidade de se apoiar as diferentes iniciativas de inclusão dos afro-brasileiros na vida e missão da Igreja. O Documento renova o ânimo das comunidades negras. Nesse sentido é muito importante que os Bispos apóiem e incentivem às iniciativas que estão acontecendo nas Dioceses.

Nos lugares em que a caminhada ainda é embrionária ou não há a consciência eclesial, uma palavra e gesto de apoio podem ser determinantes. O secretariado de Pastoral Afro-brasileira da CNBB está inteiramente a serviço dos Regionais e das Dioceses que desejarem alguma orientação.

Depois de vinte anos da Campanha da Fraternidade sobre o povo negro nada mais que justo que as Dioceses prestem esse serviço ao povo empobrecido e vivam os objetivos da própria CNBB, incluindo a opção preferencial da Igreja. Um olhar mais atento à realidade ainda marcada pelo empobrecimento, pelo preconceito e pela discriminação, revela que a contribuição do Episcopado será fundamental para ao desenvolvimento da pastoral ainda mais intenso da pastoral afro-brasileira.

Pe. Ari Antônio Reis

Pe Jurandir Azevedo Araújo

Autores:

Pe Ari Antônio dos Reis: Presbítero da Diocese de Passo Fundo, mestre em teologia pastoral pela Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, professor licenciado do Instituto de Teologia e Pastoral de Passo Fundo, assessor nacional da pastoral afro-brasileira.

Pe Jurandir Azevedo de Araújo sdb: Presbítero Salesiano, mestre em educação, psicólogo clínico e psicopedagogo. Atualmente responde pelo setor de leigos da Inspetoria São João Bosco-MG. Membro do Secretariado de Pastoral afro-continental – SEPAFRO-CELAM.

Bibliografia:

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CHIAVENATO, Júlio José. O negro no Brasil. São Paulo: Brasiliense. 1986.
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________Documento de Aparecida: Texto conclusivo da V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho. Brasília: Edições CNBB, 2007.
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LOPEZ, Maricel Mena e NASH Peter Theodore. Abrindo sulcos: para uma teologia afro-americana e caribenha. São Leopoldo: Sinodal. 2004.
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ROWER. Frei Basílio. O Convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro. Petrópolis: Vozes, 1945.
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SILVA, Eduardo. As Camélias do Leblom e a abolição da escravatura: uma investigação de história e cultura. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
[1] Os povos indígenas também foram envolvidos no processo escravagista. A vantagem em relação aos negros era de cunho comercial. Aproveitava-se o trabalho na lavoura e também o comércio tripartite.
[2] Cf. Julio J. CHIAVENATO. O negro no Brasil, p. 48.
[3] João Paulo II. Discurso aos afro-americanos. Conclusões de Santo Domingo, p. 258.
[4] Tal empreendimento econômico exigiu uma ideologia de justificação. Era necessário encontrar bons argumentos para justificar a escravidão. Tais argumentos foram bem construídos a ponto de fazerem da escravidão e posteriormente a discriminação fenômenos tidos como naturais e não construção humana.
[5] Alguns personagens desta época passaram para a História como batalhadores pela causa abolicionista. Citamos José do Patrocínio, André Rebouças, Joaquim Nabuco entre outros. Alguns abolicionistas pregavam também o ideal de tornar o Brasil menos negro, a chamada ideologia do branqueamento. Ver: CNBB. Ouvi o clamor deste povo, parágrafos 56 e 57.
[6] Sobre o movimento abolicionista sugerimos ler: Eduardo SILVA. As Camélias do Leblom e a abolição da escravatura: uma investigação de história e cultura. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
[7] Computados os registros estatísticos, revelou-se o quadro persistente de dramática inferioridade do segmento negro em face do segmento branco da população brasileira, com relação a grau de instrução, ocupação profissional e nível de rendimentos. Ver Jacob GORENDER. A escravidão reabilitada, p. 11.
[8] Cf. Conclusões de Santo Domingo, n. 246.
[9] Cf. DA 89
[10] CF. DA 56
[11] CNBB. Ouvi o Clamor deste povo. Números 60 ss.

[12] João Paulo II – Carta aos afro-americanos in Conclusões de Santo Domingo p. 258.
[13] Cf. Documento de Puebla 8. Também. CNBB. Ouvi o clamor deste povo. n. 70s.
[14] Sobre o tema ver: José Oscar BEOZZO. As Américas Negras e a História da Igreja: questões metodológicas. Revista Religião e sociedade nº 10, novembro de 1983, p. 80.
[15] Estudos da CNBB número 85 – pastoral afro-brasileira
[16] Cf. Frei Basílio ROWER. O Convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro. Petrópolis: Vozes, 1945.
[17] Cf. Documento de Puebla p. 34
[18] Cf. Conclusões de Santo Domingo. n. 249.
[19] C. Exortação Apostólica Ecclésia in América n. 64.
[20] CF. DA 75
[21] CF. DA 533
[22] Cf. DA n. 99, 532.
[23] Cf. DA n. 533.
[24] Cf. DA n. 96.
[25] Cf. DA n. 97.
[26] Cf. Pe. Antônio Aparecido da SILVA. Comunidade Negra: desafios atuais e perspectivas, p. 39.
[27] CF. CRB Nacional – GRENI. Ternura e resistência: presença afro na vida consagrada, p. 5. O Documento de Aparecida, no número 94, ressalta a importância de incentivar vocações oriundas das culturas indígenas e dos afro-americanos.
[28] Cf. Estatuto da articulação de bispos, presbíteros e diáconos negros do Brasil, artigo III, parágrafo III.
[29] Cf. Santo Domingo n. 80 e Documento de Aparecida n. 94

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