A conversão de São Paulo

A impressão que se tem de Paulo nos relatos de São Lucas é que ele foi um ardoroso perseguidor dos primeiros cristãos. Lemos no livro dos Atos dos Apóstolos, capítulo 22, versículos 3 e 4, Paulo dizendo: “Eu estava cheio de zelo por Deus, persegui até a morte este Caminho, prendendo e jogando na prisão homens e mulheres”.

Quando ele diz que “estava cheio de zelo por Deus”, isto significa que lutava em defesa da sua fé e da observância da lei mosaica, e que alguém estava introduzindo mudanças nas tradições religiosas de seu povo, enganando o povo com mentiras e desvirtuando a pureza do seu judaísmo. Esse alguém eram os cristãos. Os cristãos irritavam os judeus, sobretudo em dois pontos: a afirmação de que Jesus de Nazaré era o messias prometido, e alguns até diziam que esse messias era Deus, e a aceitação de não judeus em suas comunidades. Lembremo-nos de que naquele momento todos eram judeus, tanto os que aceitavam como os que não aceitavam Jesus como messias, e que ninguém pensava em deixar de ser judeu. Na realidade, discutia-se para se ver quem era verdadeiramente judeu.

Os cristãos se acreditavam verdadeiros judeus, fiéis às tradições de Moisés. Paulo, porém, pensava de outro jeito. Os cristãos eram apóstatas de fé judaica, difundindo a mentira da ressurreição de um Jesus que estava bem morto, e maculando a pureza judaica com a admissão de pagãos entre eles. Lucas descreve de forma exuberante a mudança de Paulo na estrada de Damasco. Por três vezes, São Lucas apresenta a conversão de Paulo, quando este judeu zeloso pela causa de seu Deus se dirigia à cidade de Damasco na Síria, com cartas de recomendação do sumo sacerdote de Jerusalém para prender os cristãos. “Saulo, por que me persegues?”: uma voz forte se faz ouvir no caminho. Envolto por uma claridade, Saulo cai do cavalo. A voz era de Jesus. Lá estava Paulo diante daquele que estava morto, que era uma mentira, uma fraude inventada por seus discípulos e que ele rejeitava com todas as suas forças. O que fazer? Paulo não era homem de negar a evidência. Não havia outro caminho no caminho de Damasco a não ser reconhecer a verdade do Caminho. Para saber o que Lucas escreve pode-se consultar o Livro dos Atos dos Apóstolos.

Lucas relata a conversão de São Paulo nos capítulos 9,1-30; 22,5-16; 26,9-18. E Paulo, o que é que ele mesmo diz de sua conversão nas cartas? Note que em Atos capítulo 9, Lucas relata a conversão na terceira pessoa, contando o que aconteceu com Paulo, mas nos outros capítulos, 22 e 26, é Paulo quem fala. O escritor, porém, é sempre São Lucas e não o próprio Paulo. Nas cartas podemos obter informações que vêm diretamente de  Paulo. É na Carta aos Gálatas que ele vai nos dizer como foi a sua conversão. Com poucas palavras, ele diz tudo o que aconteceu. Confira Gálatas 1,15-16. Lá está escrito: “Quando, porém, aquele que me separou desde o seio materno e me chamou por sua graça, houve por bem revelar em mim o seu Filho, para que eu o evangelizasse entre os gentios, não consultei carne nem sangue…”. Segundo este texto, o que foi que aconteceu com Paulo em Damasco? Deus revelou nele seu Filho, Jesus Cristo. Paulo fez uma experiência interna da verdade de Jesus. Ele experimentou dentro dele mesmo, por graça de Deus, que Jesus existia, estava vivo e não era uma fraude. Algo muito forte aconteceu na vida de Paulo naquele momento. Ele sentiu por dentro a presença de Jesus e entregou-se. Não tinha outro jeito. Ali estava Jesus vivo, o Messias vindo de Nazaré, enviando-o a anunciar o Evangelho aos pagãos, os dois pontos que irritavam os judeus e o próprio Paulo. Tudo pode ter acontecido como São Lucas descreve. O importante, porém, é que Paulo fez uma experiência pessoal de Jesus.

Cônego Celso Pedro
Arquidiocese de São Paulo

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