São Paulo é uma fonte inesgotável de espiritualidade, não só para os cristãos, mas para toda a humanidade. Mesmo dois mil anos depois do seu nascimento, sua personalidade nos inspira.
O acontecimento da sua conversão continua nos questionando. O que aconteceu? São Paulo precisava de conversão? Não era um judeu exemplar? Não levava uma vida imoral. Ele guardava todos os mandamentos e a lei judaica. Não precisava se levantar do pecado e voltar à casa do Pai. Ele servia com fidelidade a Lei mosaica, o templo, as tradições. Seu zelo pela tradição era muito grande… Ele não era um filho pródigo. Qual era então o pecado dele para precisar de conversão? Ele já era um homem muito zeloso antes do acontecimento de Damasco. Paulo fala de si mesmo: “Progredia no judaísmo mais do que muitos compatriotas da minha idade, distinguindo-me no zelo pelas tradições paternas” (Gl 1, 14).
Lutava pelas tradições e a identidade judaica. Para guardar a pureza da fé dos pais muitos deram heroicamente seu sangue. Paulo agia com as melhores intenções. A conversão de São Paulo não foi uma conversão no sentido comum da palavra ou uma conversão de uma vida imoral.
No entanto, no caminho de Damasco ele percebeu, num certo momento, que era cego. Só depois que entrou na casa de Ananias ele começou a enxergar. O que começou a enxergar? Ele continua valorizando as tradições judaicas. Não nega que ele recebeu a tradição de seu povo. Parece que ele chegou ao fim de um caminho que foi até este momento muito válido, mas que agora chegou ao ponto final. Não foi um caminho errado. Não era um caminho pecaminoso. A observância da lei em si não é pecado. Mas o que aconteceu?
“Eu sei que o bem não mora em mim, isto é, na minha carne. Pois o querer o bem está ao meu alcance, não porém o praticá-lo. Com efeito, não faço o bem que quero, mas pratico o mal que não quero. Ora, se faço o que não quero, já não sou eu que ajo, e sim o pecado que habita em mim. Verifico, pois, esta lei: quando quero fazer o bem, é o mal que se me apresenta. Comprazo-me na lei de Deus segundo o homem interior; mas percebo outra lei em meus membros, que peleja contra a lei da minha razão e que me acorrenta à lei do pecado que existe em meus membros. Infeliz de mim! Quem me libertará deste corpo de morte? Graças sejam dadas a Deus, por Jesus Cristo Senhor nosso” (Rm 7, 18-24).
Paulo mudou de vida, não pela meditação da Palavra, mas por um acontecimento. De repente, a luz do Cristo ressuscitado o envolveu por completo e uma voz dizia: “Saul, Saul, por que me persegues?” No fim, Paulo perseguia quem e por quê? No centro de toda a história da conversão está o encontro com Cristo ressuscitado.
A luz no caminho de Damasco mudou o relacionamento de Paulo com Deus. A salvação vem pela fé em Jesus Cristo e não pelas próprias obras. A conversão de Paulo não é uma conversão a partir da lista dos dez mandamentos. Ele se encontrou com Alguém, com Jesus, que mostrou o que é o amor de verdade. Deus faz grandes coisas nas pessoas. É preciso só permitir. Isso é a fé. A conversão de Paulo é a mudança de consciência de alguém que confiava nas suas próprias forças para uma fé na gratuidade do amor de Deus. No caminho de Damasco ele se encontrou com alguém.
Ele percebeu que é incapaz de cumprir a lei. Isso leva o ser humano a assumir atitudes de hipocrisia. Contra estas atitudes de “sepulcros caiados” Jesus reagiu muito. É a atitude do irmão mais velho do filho pródigo, que nunca teve consciência e nem experimentou a alegria de viver na casa do Pai. Estas atitudes levam ao fanatismo. Paulo começou a matar em nome de Deus, pensando que estava fazendo o bem. Paulo experimentou que o caminho de Damasco leva à morte. Fazia o mal e não sabia. Ele estava cego. E não tinha consciência disso. De repente ele vê a contradição entre aquilo que ele prega e aquilo que ele faz. Ele vê que não consegue cumprir a lei. Embora a lei seja boa, ele não consegue caminhar neste caminho.
Além disso, Paulo experimentou que o homem não se salva com suas próprias forças e conhecimento. A salvação vem de Deus, e vem de graça, não por mérito.
“Sou agradecido para com aquele que me deu força, Cristo Jesus, nosso Senhor, que me julgou fiel, tomando-me para o seu serviço, a mim que outrora era blasfemo, perseguidor e insolente. Mas obtive misericórdia, porque agi por ignorância, na incredulidade. Superabundou, porém, para mim, a graça de nosso Senhor, com a fé e o amor que há em Cristo Jesus” (1Tm 1, 12-14).
Até então Paulo achava que a salvação dependia da força de vontade e do esforço do homem. Ele devia merecer o céu com suas obras. Seguir escrupulosamente a lei de Deus mostra a incapacidade diante dela. Paulo experimentou a misericórdia de Deus.
Depois deste encontro Paulo se tornou um evangelizador. Ele é alguém que anuncia o querigma, Jesus Cristo, morto e ressuscitado. Não é uma idéia, mas uma pessoa que ele encontrou. Ele anuncia aquilo que ele experimentou, ou melhor, Aquele que ele ouviu, o Cristo vivo que se manifestou a ele. “Saul, Saul, por que me persegues?” (At 9, 4). Agora Paulo segue outro caminho, “O Caminho” que ele antes perseguia (cf. At 9,2). Após o encontro com Cristo, Paulo entendeu que os cristãos não são traidores, mas seguidores de Jesus Cristo, que é “O” Caminho.
Para refletir
- Qual é a minha cegueira neste momento?
- Por onde passa ou passou o meu caminho de Damasco? Que conversão deve acontecer na minha vida?
- Quando e em que situação experimentei a misericórdia de Deus em minha vida?