Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte
O Censo Demográfico 2010, apresentado pelo IBGE, está merecendo uma especial consideração no que diz respeito ao cenário religioso da sociedade brasileira. Contudo, esse interesse, obviamente, não pode apenas ser em função do conjunto da dança de números: a constatação de declínio na declaração de crença quanto ao catolicismo, o crescimento daqueles que dizem não ter religião, ou, ainda, a consideração do crescimento evangélico, fruto do viés pentecostal.
Esse cenário de diversificação há de produzir leituras e interpretações em algumas direções essenciais. Uma delas refere-se à configuração e aos funcionamentos institucionais das diferentes confissões religiosas. É importante avaliar o sentido de pertença e a mobilidade religiosa que atinge o interior de cada confissão, refletir sobre a capacidade de agregar e formar pessoas, nas diferentes etapas da vida. Também é essencial analisar e compreender a importância de cada instituição na configuração de uma sociedade melhor, na formação de uma consciência cidadã. O compromisso com uma conduta pessoal, social e política, que sustente e promova uma sociedade mais ancorada na justiça e na solidariedade é central na avaliação da fé cristã e de sua autenticidade.
As estatísticas são de grande importância para análises e interpretações qualitativas capazes de contribuir para que a vivência na confissão religiosa configure uma mudança na vida pessoal, social e política, estimulando um entendimento mais adequado da significação da fé em Deus. Em questão, por exemplo, está um entendimento equivocado da fé cristã, até com força de atração por despertar interesses imediatos, como é o caso da compreensão de Deus como um sujeito de barganha ou um milagreiro. Nesse caso, um milagreiro que está à disposição e à mercê do que se entende, erroneamente, como vivência da fé. Um grave equívoco que leva ao absurdo de interligar oferta em dinheiro e a condição para se receber o milagre esperado. Trata-se de um viés situado na chamada teologia da prosperidade que, lamentavelmente, leva a explorações e a verdadeiros desvios, usufruindo das necessidades prementes de saúde e de sucesso.
Essa compreensão sustenta explicações também inadequadas, como a de que alguém não conseguiu um milagre ou uma benção por ser fraco na fé, entendendo a fé como uma força que tem sua fonte na própria pessoa, em detrimento do intocável sentido de obediência à vontade de Deus. Esse é apenas um exemplo para sublinhar que o Censo com suas pertinentes estatísticas deve instigar um processo interpretativo e de avaliação quanto ao papel da confissão religiosa na vida das pessoas e no tecido da sociedade, sem que se possa dispensá-la de sua importante contribuição sociocultural. Nesse horizonte, a Conferência Nacional doa Bispos do Brasil (CNBB), no dia em que o IBGE divulgou o Censo 2010, apresentou resultados de um estudo produzido pelo Centro de Estatísticas Religiosas e Investigação Social (CERIS) – entidade brasileira de pesquisa religiosa fundada pela própria CNBB. Esse trabalho mostra que a Igreja Católica não apenas continua majoritária na sociedade brasileira, reunindo 64,6% da população, como também cresceu vertiginosamente em número de paróquias e dioceses, vocações, na efervescência de novos movimentos eclesiais e nos investimentos na rede de comunidades. Nessa mesma perspectiva de reflexão e avaliação qualitativa, a partir dos números, a Arquidiocese de Belo Horizonte, considerando as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, a convocação para pensar e agir no horizonte de uma Nova Evangelização, está vivendo o processo da sua IV Assembleia do Povo de Deus. É hora de avaliar, rever e ousar, por uma escuta qualificada, pelo compromisso de consolidar a tarefa insubstituível que a Igreja Católica tem no tecido cultural e sociopolítico, na alegria de anunciar o Evangelho do Reino.