Colocar a vida diante da misericórdia de Deus

Dom José Gislon
Bispo de Caxias do Sul

Nos domingos do tempo Pascal, a nossa atenção vem direcionada sobre a Igreja, comunidade dos fiéis, nascida da Páscoa de Cristo, colocando em evidencia os vários aspectos da vida dos cristãos, chamados a serem testemunhas do Senhor ressuscitado.

Os textos da Palavra de Deus, deste 2º domingo da Páscoa, nos mostram uma descrição da comunidade cristã ideal, na qual os que crêem no Senhor são assíduos participantes e se dispõem a escutar os ensinamentos dos apóstolos, na celebração eucarística e na oração. Todos estão unidos e vivem a comunhão fraterna, também na partilha dos bens. Na realidade, sabemos que também nas primeiras comunidades da Igreja existiam divisões, dificuldades e egoísmo. O ideal nos mostra como deveria ser, a meta que devemos buscar alcançar: tornarmo-nos uma Igreja fervorosa por Cristo e, por isso, pronta a reconhecer os outros como irmãos.

Como Igreja, comunidade de fé, não devemos deixar de dar graças a Deus, porque ele é bom e eterna é a sua misericórdia. Queremos manifestar o nosso louvor pelo seu amor, que se manifesta na sua misericórdia. “Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Em sua grande misericórdia, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, ele nos fez nascer de novo, para uma esperança viva, para uma herança incorruptível, que não se mancha nem murcha, e que é reservada para vós nos céus” (1Pd 1,3-4). O dom do batismo nos inseriu numa realidade nova, feita de esperança na herança eterna. Jamais terminaremos de agradecer o Senhor por esse dom, e durante o tempo pascal teremos a ocasião para meditar sobre ele.

Neste tempo marcado pelo medo da pandemia, de isolamento social, de incertezas em relação ao futuro, podemos ter a tentação de nos perguntar: Onde está Deus? Mas é bom, e nos faz bem, recordarmos que Deus, autor da vida e Pai de misericórdia, mesmo nos momentos mais dramáticos da história da humanidade, nunca deixou de se manifestar aos homens e de alimentar na vida da humanidade a esperança; não deixou morrer o amor, o perdão, a solidariedade, a caridade e a fé no coração das pessoas.

A dúvida tocou também a fé do apóstolo Tomé, e a experiência que ele teve, de encontrar o Ressuscitado, mudou a sua vida. Porque ele encontra um Cristo que se aproxima dos discípulos, mesmo estando fechadas as portas, não está mais amarrado aos confins da existência terrena, mesmo assim está vivo, é real. O medo de serem perseguidos levou os apóstolos a se esconderem, depois da morte do Senhor Jesus. A presença do Ressuscitado, que aparece no meio deles com os sinais da sua morte e da sua vitória, reacende em seus corações a confiança e a esperança, porque vêem as suas feridas luminosas, que não indicam somente a humilhação da morte, mas a sua glória. Ele doa a sua paz, isto é, a plenitude da vida.

Tomé que não estava presente quando Jesus ressuscitado apareceu aos discípulos pela primeira vez, não acredita no testemunho dos irmãos. Ele não estava com a comunidade quando Jesus apareceu. É o protótipo do ausente, a personificação da dúvida dos discípulos sobre a ressurreição de Cristo. Jesus não aparece privadamente ao discípulo incrédulo, para tirar a sua dúvida, mas somente na comunidade: é na Igreja que podemos encontrar os sinais do Ressuscitado. A fé nunca é um fato privado, mas sempre eclesial e isto é solicitado aos discípulos do Senhor Jesus de todos os tempos.

 

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