Combater a pobreza, construir a paz (II) (apresentando a mensagem de Bento XVI)

Na mensagem do Santo Padre Bento XVI, para o dia mundial da paz, celebrado no dia primeiro de janeiro, ao propor caminhos para a superação da pobreza, ele, como não poderia deixar de ser, colocou em primeiro plano a necessidade da justiça, tendo com motivação a solidariedade.” Sem a mística da solidariedade não é possível ir às raízes mais profundas das injustiças geradoras da pobreza. Assim: muitas “medidas detêm-se frequentemente nas causas superficiais e instrumentais da pobreza, sem chegar às que se abrigam no coração humano, como a avidez e a estreiteza de horizontes”. “A luta contra a pobreza precisa de homens e mulheres que vivam profundamente a fraternidade e sejam capazes de acompanhar pessoas, famílias e comunidades por percursos de autêntico progresso humano”.

A luta contra a pobreza exige, no entender do santo Padre, uma globalização justa, comércio internacional justo, mercado financeiro justo, cooperação nos planos econômico e jurídico e participação da sociedade civil.   Passo ao leitor algumas considerações do Santo Padre sobre as medidas propostas.

  1. Sobre a globalização justa: “A globalização se apresenta com uma acentuada característica de ambivalência”. É preciso “ter em conta primariamente as exigências dos pobres da terra”. É necessária “uma globalização que tenha em vista os interesses da grande família humana”. Ainda:  “Uma forte solidariedade global  entre países ricos e países pobres, como também no âmbito interno de cada uma das nações”.Insiste na necessidade de um “código ético comum”, enraizado “na lei natural inscrita pelo Criador na consciência de todo o ser humano” (cf. Rm 2, 14-15).  “A marginalização dos pobres da terra só pode encontrar válidos instrumentos de resgate na globalização, se cada homem se sentir pessoalmente atingido pelas injustiças existentes no mundo e pelas violações dos direitos humanos ligadas com elas”.
  2. Sobre o comércio internacional justo: “No campo do comércio internacional e das transações financeiras, temos hoje em ação processos que permitem integrar positivamente as economias”.  “Mas há também processos de sentido oposto, que dividem e marginalizam os povos, criando perigosas premissas para guerras e conflitos”. Há paises, sobretudo na África,“em que a dependência das exportações de produtos primários continua a constituir um poderoso fator de risco. Quero reiterar aqui um apelo para que todos os países tenham as mesmas possibilidades de acesso ao mercado mundial, evitando exclusões e marginalizações”.
  3. Sobre o mercado financeiro justo: “A função objetivamente mais importante do mercado financeiro, que é a de sustentar a longo prazo a possibilidade de investimentos e consequentemente de desenvolvimento, aparece hoje muito frágil”. “A própria crise recente demonstra como a atividade financeira seja às vezes guiada por lógicas puramente auto-referenciais e desprovidas de consideração pelo bem comum a longo prazo”. “Uma atividade financeira confinada no breve e brevíssimo prazo torna-se perigosa para todos, inclusive para quem consegue se beneficiar dela durante as fases de euforia financeira”.
  4. Sobre a cooperação nos planos econômico e jurídico: É preciso uma cooperação internacional para encontrar “soluções coordenadas para enfrentar os referidos problemas através da realização de um quadro jurídico eficaz para a economia”. No lugar do mero assistencialismo: “investir na formação das pessoas e desenvolver de forma integrada uma cultura específica da iniciativa parece ser atualmente o verdadeiro projeto a médio e longo prazo”. “Bento XVI adverte: “seja banida a ilusão de que uma política de pura redistribuição da riqueza existente possa resolver o problema de maneira definitiva. De fato, numa economia moderna, o valor da riqueza depende em medida determinante da capacidade de criar rendimento presente e futuro. Por isso, a criação de valor surge como um elo imprescindível, que se há- de ter em conta se se quer lutar contra a pobreza material de modo eficaz e duradouro”.
  5. Sobre a participação da sociedade civil: “Colocar os pobres em primeiro lugar implica, finalmente, que se reserve espaço adequado para uma correta lógica econômica por parte dos agentes do mercado internacional, uma correta lógica política por parte dos agentes institucionais e uma correta lógica participativa capaz de valorizar a sociedade civil local e internacional”. O Papa insiste na “criação de positivas sinergias entre mercados, sociedade civil e Estados” e acrescenta: “particularmente a sociedade civil assume um papel crucial em todo o processo de desenvolvimento, já que este é essencialmente um fenômeno cultural e a cultura nasce e se desenvolve nos diversos âmbitos da vida civil”. Mas para que a pobreza seja superada é necessária uma cultura moldada pelo senso de justiça e pela solidariedade.

Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues

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