Dom Geraldo dos Reis Maia
Bispo de Araçuaí (MG)

 

Vivemos a espiritualidade de profunda expectativa. As dramáticas e envolventes trevas do luto, pela perda do querido Papa Francisco, serão vencidas e a feliz madrugada da ressurreição haverá de despontar. Não há lugar para tristeza em nossa vida cristã, pois somos o Povo da Aliança, um povo redimido no Mistério Pascal do Senhor e assistido pela graça do Espírito Santo. Antes de partir, o Senhor nos prometeu que não nos deixaria sozinhos, enviaria o Paráclito, o Consolador (cf. Jo 14,15-18). 

Reunidos no interior da belíssima Capela Sistina, decorada artisticamente por Michelangelo e outros mestres do Renascimento, cento e trinta e três cardeais, representantes de todo o universo católico, em breve, começarão o processo de escolha do novo Servo dos servos de Deus, em clima de oração e de reflexão, sob a assistência do Espírito Santo e a proteção da Virgem Maria, como no Cenáculo de Jerusalém (cf. At 1,14). Será o 267º ao longo da História da Igreja. Assim como Jesus designou a Pedro, seu Sucessor tem a missão de confirmar os irmãos na fé (cf. Lc 22,32). 

Sinalização sintomática é a presença de expressivo número de profissionais da imprensa mundial cadastrados para cobrir, seja os funerais do Papa Francisco, seja o Conclave. O mundo inteiro está voltado para o Vaticano. Inúmeras serão as transmissões da porta da Capela Sistina sendo fechadas, ao ouvirmos a fórmula latina “extra omnes” (todos para fora!), para dar início ao Conclave. 

Daquela porta, as câmeras serão voltadas para a chaminé instalada nos telhados da mesma Capela, na expectativa de capturar os primeiros sinais da fumaça branca, que comunicará ao mundo a eleição do novo Papa. Dali, essas câmeras terão seus focos dirigidos para a Loggia di San Pietro, o balcão da Basílica, no qual surgirá a figura do novo Papa eleito, precedida pelo anúncio solene e esperado do Cardeal Proto-Diácono “Habemus papam”, sob o badalar dos sinos da imponente Basílica edificada sobre o túmulo de São Pedro. 

A expressiva presença da mídia sinaliza que a Igreja não está em declínio, como profetas do mau agouro insistem em anunciar. Conceituado jornalista, nesses últimos dias, observou que se diz da decadência da Igreja desde os tempos do Império Romano… E o Concílio Vaticano II já nos alertou: “Entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus, avança, peregrina, a Igreja, anunciando a cruz e a morte do Senhor até que ele venha (cf. 1Cor 11,26). Mas é fortalecida pela força do Senhor ressuscitado, a fim de vencer, pela paciência e pela caridade de suas aflições e dificuldades, tanto internas quanto externas, para poder revelar ao mundo o mistério d’Ele, embora entre sombras, porém com fidelidade, até que, no fim, seja manifestado em plena luz” (LG, 8). 

Portadora da mensagem evangélica, a Igreja tem uma palavra importante para dirigir ao mundo de hoje. Trata-se de um diálogo imprescindível e inadiável. Este é o “diálogo da salvação”, como acentuava o papa Paulo VI, na encíclica programática de seu ministério, apontando para a missão do Concílio Vaticano II, Ecclesiam Suam. Este diálogo deve estar a serviço do ser humano, travado com as várias denominações cristãs, com as diversas religiões e com os não-crentes; com o mundo das ciências, das filosofias e das variadas culturas; com a sociedade, a política e a economia. A Constituição Pastoral do Concílio acolheu este programa e acentuou esse importante e irrenunciável diálogo da Igreja com o mundo contemporâneo (Gaudium et Spes). 

Seria o novo papa um europeu, um asiático, um africano, um norte-americano, um latino-americano? Branco, negro, oriental… Não importa a sua procedência nem a sua etnia. O importante é que ele haverá de falar a língua da fé que une os povos e nações e haverá de nos motivar a dar as razões da nossa esperança cristã num tempo repleto de desafios. Será ele o profeta a denunciar as mazelas de uma cultura que valoriza o ter e se distancia do bem comum e dos valores do Evangelho. Haverá de apontar os caminhos para se edificar a cultura da paz, baseada no perdão, na justiça do Reino e na solidariedade que une os povos. Que ele continue a nos ajudar a cuidar da “Casa Comum”, obra da criação de Deus, diante dos interesses do lucro fácil e da exploração desmedida. 

Que o enviado de Deus possa dialogar com as várias denominações cristãs, com as inúmeras religiões e com o mundo moderno, em continuidade à abertura e às reformas sempre necessárias à vida da Igreja, especialmente nesse longo processo de acolhida do Concílio Vaticano II. Que ele nos guie em meio aos dramas da humanidade e nos ajude a compreender sempre mais qual é a centralidade de nossa fé: Jesus Cristo, o Salvador da humanidade, a Luz do mundo! É neste sentido que rezamos ao Senhor da Messe, inspirados pelo Espírito que sopra onde quer: que o Senhor nos envie o homem certo para este tempo certo de nossa Igreja presente no mundo, como testemunha do Evangelho para que o mundo creia (cf. Jo 17,21). 

 

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