Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)

 

O ser humano é verdadeiramente um mistério para si mesmo.  Apesar de ser uma das criaturas mais adaptáveis que existem no Planeta, é também a criatura mais inconformada, pois somente se houver esperança, ele poderá viver na alegria.  Somente o ser humano, dentre todas as criaturas, experimenta o tédio, pois tem sede de plenitude e sabe que não encontrará paz nem mesmo se conquistar o mundo inteiro.  

Isso ocorre porque o ser humano foi feito para transcender a si mesmo.  Ele não deseja apenas viver eternamente, vencendo a morte, mas busca uma plenitude de vida, que tenha sentido e beleza. Daí nasce a esperança de uma plenitude que deve chegar.  

A esperança cristã é simbolizada pela âncora. Na Carta aos Hebreus, se lê sobre a esperança: Nela temos como que uma âncora da nossa vida segura e firme. (Hb 6,19). Ela é segura e firme porque é atirada não ao mar, mas ao céu, não no tempo, mas na eternidade. Para os cristãos, a âncora representa estabilidade e segurança. Marinheiros e navegantes sempre lembravam uns aos outros antes de se lançarem ao mar: “Não saia do porto sem levar uma âncora.”  

A esperança, diz o pensador francês Péguy, é quem tudo arrasta consigo, porque a fé só vê o que existe, ao passo que a esperança vê o que existirá. O amor só ama o que existe, mas a esperança ama o que existirá no tempo e por toda a eternidade. 

Na contradição entre o hoje e o amanhã, entre a experiência e a espera, nos defrontamos com as várias possibilidades do futuro: desespero, presunção ou esperança.  

Desespero é a atitude daqueles que negam o futuro porque o identificam com o mal presente. Entende-se que o mundo é um caos e está no fim. Tudo está errado e não há mais saída. Pensa-se o presente como tédio.  

Presunção é a recusa do presente, atitude daqueles que avaliam falsamente a si mesmos e as capacidades do mundo, dos que identificam o presente com o bem que deve vir. Esquecem-se da lei do sofrimento e da finitude do ser. “Estas duas coisas matam a alma: o desespero e a falsa esperança” escreveu Santo Agostinho.  

A esperança, afinal, é a tendência para um bem futuro e realizável. É uma energia interna, que cresce na pessoa e a torna capaz de derrubar muros e obstáculos considerados intransponíveis. É um sentimento que leva a olhar para o futuro, tido como portador de condições melhores do que as do presente. Assim, até mesmo os sofrimentos são enfrentados como situações efêmeras, diante de um fim mais alto e de maior valor. 

 

 

 

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