Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta    

 

Foi com escárnio que Herodes, Pilatos e os chefes do povo trataram Jesus no momento de sua condenação. “Se és rei dos judeus, salva-te a ti mesmo” (Lc 23,37). A Pilatos, Jesus declarou: “Tu o dizes, que eu sou rei” (Jo 18, 37). A questão principal é a compreensão deste reinado. O grande anúncio de Jesus Cristo foi o Reino de Deus, inaugurado e levado à plenitude por Ele: “reino da verdade e da vida, reino da santidade e da graça, reino da justiça, do amor e da paz” (Prefácio Cristo, Rei do Universo). Muito difícil compreender este reinado de Jesus neste dramático momento da cruz e nos sofrimentos do mundo atual. No entanto, foi exatamente aí que Jesus, plenamente, soube amar e doar a vida. Ele é o rei salvador, que oferece ao ladrão arrependido e a toda a humanidade a possibilidade da vida plena com Ele: “ainda hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23, 43).

Esta solenidade litúrgica, na sua origem, em 1925, pelo Papa Pio XI, tinha a intenção de afirmar, além das questões espirituais, o lugar único de Cristo para a humanidade e no âmbito do universo. Uma ordem social, para nós cristãos, sempre deve se inspirar em Cristo. Vemos que a inspiração continua ainda válida, com outra configuração, sobretudo num tempo de indiferença religiosa. Cristo é apresentado como o centro e senhor da história, “o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim” (Ap 22, 12-13). Paulo, na Carta aos Colossenses, diz que Deus quis “por ele reconciliar consigo todos os seres, os que estão na terra e no céu, realizando a paz pelo sangue da sua cruz” (Cl 1,20). O caminho da reconciliação e da paz na sociedade humana passa por Cristo, pelo seu evangelho, que é um apelo à acolhida e à misericórdia.

De fato, os autores cristãos, ao interpretarem a Escritura, viram um sentido cósmico da vida e missão do Filho de Deus que se Encarnou. Ele é “o primogênito de toda de toda a criação, pois por causa dele foram criadas todas as coisas do céu e na terra […]. Tudo foi criado por meio dele e para ele” (Cl 1, 16). Sim, acreditamos num sentido de tudo o que foi criado, que terá sua plenitude realizada no fim dos tempos, enquanto “até hoje toda a criação geme e padece, como em dores de parto” (Rm 8,22). Tertuliano, ao explicar a criação do ser humano, na primeira página do Gênesis, dizia: “Em tudo o que no barro estava sendo feito (Gn 2,7) era em Cristo que se pensava, naquele que devia fazer-se homem, isto é, barro, ao Verbo que devia fazer-se carne, o que então era ainda terra” (Tertuliano, De resurrectione carnis, 6). O ponto alto de todo o Universo é a Encarnação do Filho de Deus. O cuidado com o meio ambiente e com os pobres, dom de Deus criador, tem para nós cristãos o sentido do lugar, da epifania do amor de Deus. Está ligado a Ele e, por causa desta ligação, a toda humanidade. Portanto, o acaso não existe no universo. Deus é criador e conduz à plenitude sua obra. Que missão exigente temos a realizar!

A plenitude que celebramos na liturgia, “por Cristo, com Cristo e em Cristo”, não significa que o seu reino esteja já realizado. Sabemos que não. Existe um caminho de acolhida na vida de cada cristão batizado. Deus precisa ser Rei de cada um de nós, como nos ensina Santa Teresa de Ávila, com a imagem do Castelo Interior, no centro do palácio, no trono onde o rei está sentado e ilumina com sua luz toda a vida. Este é o caminho espiritual. Também, o caminho do empenho social está contemplado no reinado de Cristo. Ao celebrarmos nossa comunhão em Cristo somos impelidos a buscarmos a fraternidade e a sermos solidários com os mais pobres. Sonhamos e nos empenhamos na realização do seu reino.

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