Recentemente a Santa Sé, através da Congregação para a Doutrina da Fé, publicou mais uma série de orientações relacionadas com a bioética. Trata-se de uma instrução sobre a dignidade da vida, a partir do momento da concepção de um novo ser humano. O documento intitula-se “A dignidade da pessoa” (Dignitas Personae), dirigido aos cristãos e a toda a comunidade humana sobre alguns aspectos essenciais referentes à concepção natural ou artificial. O texto divide-se em três partes. Aborda primeiramente alguns aspectos antropológicos e teológicos, apontando as questões éticas da vida e da procriação humana. O segundo conjunto temático aborda a nova problemática das técnicas de auxílio à fertilidade, tais como a fecundação “in vitro” e a eliminação voluntária dos embriões que “sobram”. Exemplo: a “intra cytoplasmic sperm injection” (ICSI) prevê, entre outros procedimentos, o congelamento dos embriões, dos ovócitos. O terceiro conjunto da Instrução apresenta algumas propostas terapêuticas, tais como a manipulação do embrião ou do patrimônio genético humano. Há muitos modos de intercepção e contra gestação, eticamente questionáveis.
O uso de células colhidas dos embriões humanos, mesmo que fossem utilizadas para fins terapêuticos, não pode ser aceita, porquanto não é ético destruir vidas humanas, mesmo em suas formas embrionárias. Trata-se de vidas humanas e não aglomerado de células. Ora, a Igreja não pode aceitar determinados tipos de manipulações genéticas. As ciências possuem suas potencialidades e também reconhecem os seus limites. A clonagem humana é um desses limites. Por que clonar um ser humano? Deus Pai Criador é um só. O que significa “brincar” de ser Deus, clonando um ser humano?
Não é eticamente aceitável a utilização de material biológico humano, isto é, obter células estaminais extraídas de embriões quando há uma infinidade de células estaminais utilizáveis, extraídas dos cordões umbilicais. Estas, sem prejuízo ético, não destroem vidas humanas.
Por certo, as reflexões e orientações da Igreja sobre a ética e sobre a moral não serão compreendidas, nem aceitas e sequer respeitadas. Porém, a Igreja não pode se calar sobre os princípios éticos e morais que se relacionam com as atitudes fundamentais dos seres humanos. Por outro lado, a Igreja deve acompanhar os avanços científicos e tecnológicos e, assim, poder contribuir com as suas reflexões para que as realidades autônomas se desenvolvam, desde que não firam e nem comprometam inevitavelmente os valores éticos e morais.
A Igreja não assume um papel meramente proibitivo, equidistante das ciências. Em matéria extremamente complexa e delicadíssima, como nas questões da bioética, não se pode deixar de defender e promover a dignidade inalienável da pessoa humana. Precisamente em nome da defesa e promoção da dignidade dos seres humanos a Igreja tenta contribuir, integrando-se às pessoas e às instituições que efetivamente colaboram para o estabelecimento de relacionamentos e comportamentos dignos, eticamente humanizados.
Para garantir a transparência de suas opiniões, a Igreja consulta centenas de cientistas de ampla visão sobre a complexidade das realidades em questão. A Igreja não pode deixar de contar com a indispensável colaboração e a opinião segura de cientistas, adentrando nos campos das pesquisas e descobertas da bioética. O papel da Igreja é sempre de discernimento e não a precipitação afoita do “ser do contra”. Antecedem aos direitos humanos os direitos divinos, que iluminam e dignificam os relacionamentos dignitosos.
Pela referida Instrução sobre a dignidade humana, a Igreja, na pessoa do Papa Bento XVl, sente-se no dever de defender os valores e direitos naturais que fundamentam o sentido da vida de cada ser humano, bem como protege a vida de certas manipulações. “Não matarás” é o Mandamento da Lei de Deus. Lei de Deus é Lei de Deus, seja respeitada ou não, agrade ou desagrade. Não se trata de invenção cultural, relativa, efêmera. Por essa razão a ética determina a exclusão de certos tipos de manipulações genéticas.