De Éfeso, a carta aos gálatas

Depois da Assembléia de Jerusalém, Paulo e Barnabé voltam a Antioquia onde passam o inverno, fim de ano naquela região. No início da primavera, Paulo deixa Antioquia para nunca mais voltar. Viajando por terra, passa pela Galácia e se dirige a Éfeso, onde é aguardado por Priscila e Áquila. Paulo os tinha deixado lá quando saiu de Corinto para Jerusalém. Pouco antes da chegada de Paulo, Apolo viaja para Corinto, enquanto alguns cristãos de tendências judaizantes, possivelmente de Antioquia, passam o fim do ano na Galácia. Epafras sai de Éfeso para dar início à missão na sua terra natal no Vale do rio Lico. Entretanto, chegam a Éfeso más notícias da Galácia. Paulo se senta e escreve os gálatas uma carta espontânea, efusiva, severa, mas refletida. Como é que os gálatas se deixaram influenciar pelos judaizantes que por lá passaram?

A carta aos gálatas é uma carta enérgica e bela, cheia de ensinamentos válidos para toda a Igreja em todos os tempos. É uma primeira revelação do genuíno evangelho de Paulo. Só Cristo basta! Em todas as cartas há uma saudação demorada, com elogios, expressões de oração e ação da graças. Nesta carta, não! Do endereço, ele já entra no assunto de forma direta e em tom firme. Como é possível que os gálatas deixem os sólidos ensinamentos de Paulo sobre o valor absoluto de Jesus para a nossa salvação e a conseqüente liberdade que dele adquirimos para aceitarem ensinamentos que propõem a observância das práticas judaicas como necessárias para a salvação?

Os gálatas eram muito bons e muito acolhedores, mas instáveis. Receberam os judaizantes da mesma forma como tinham recebido Paulo e aceitaram sem muita reflexão os novos ensinamentos. Não só por isso evidentemente, mas sobretudo porque é mais fácil observar preceitos do que viver uma liberdade responsável. Nesta fase, Paulo acreditava que a aceitação de Cristo na fé era suficiente para a vida nova dos convertidos e que as estruturas de apoio à fé surgiriam de forma natural e espontânea, sem abafar o espírito. A liberdade plena seria vivida no bom senso do discernimento e na caridade fraterna. É claro que isso supõe uma atividade criativa constante para discernir o que mais convém em cada momento no Espírito de Jesus Cristo. E é claro também que isso é exigente e cansativo. É muito mais fácil observar leis na obediência.

Paulo escreve seis capítulos. O centro da carta está em 5,1: “Foi para a liberdade que Cristo nos libertou”. Tudo converge para esse ponto, e o que segue é decorrência. Esse pensamento conclui o que veio antes e dá início ao que vem depois.

Paulo abre a carta perguntando como os gálatas puderam aceitar um evangelho diferente do que ele lhes tinha anunciado. Em seguida, defende a sua posição, mostrando ter recebido de Deus mesmo o chamado para o serviço do Evangelho de Jesus entre os pagãos. Ele não se sente devedor dos dirigentes de Jerusalém, mas assim mesmo confrontou sua doutrina com eles, que apenas pediram que Paulo e seus companheiros se lembrassem dos pobres. É aqui que Paulo descreve como foi que ele se converteu a Cristo. Em Gl 1,15-16 ele escreve: “Aquele que me separou desde o seio materno e me chamou por sua graça, houve por bem revelar em mim o seu Filho, para que eu o evangelizasse entre os gentios”. Deus revelou Jesus Cristo dentro da pessoa de Paulo. Paulo teve uma experiência pessoal única e profunda da realidade viva de Jesus.

Termina essa grande introdução expondo o que ele anuncia como o seu Evangelho: “O homem não se justifica pelas obras da Lei, mas pela fé em Jesus Cristo. Pelas obras da Lei ninguém será justificado. Se volto a edificar o que demoli, sou um transgressor. Fui crucificado com Cristo. Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim. Eu vivo a vida atual pela fé, a do Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim. Se a justiça vem pela Lei, Cristo morreu em vão”. Em seguida, ele dá seis argumentos para provar a sua tese e tira as conseqüências praticas da liberdade conquistada por Cristo.

Cônego Celso Pedro
Arquidiocese de São Paulo

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