Com o anúncio de que, em breve, haverá o lançamento do missal com a nova versão do Pai Nosso desejado pela Conferência Episcopal Italiana (CEI), onde na oração, a invocação a Deus “não nos induza à tentação” (‘non indurci in tentazione’) foi alterada com uma tradução considerada mais apropriada “não nos abandone à tentação” (‘non abbandonarci alla tentazione’), dom Edmar Peron, assessor da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foi procurado pela BBC Brasil, para falar sobre o assunto.
Na ocasião, o bispo disse que a mudança se fez necessária e que, na tradução, se procurou chegar o mais próximo possível do original. “Não é tão simples traduzir de maneira exata a expressão do texto como está no grego, o que é importante é garantir aquele sentido”, disse. De acordo com dom Edmar, no texto italiano era como se Deus colocasse tentações para nós. “É importante a tradução nova do texto do Pai Nosso na versão italiana, o sentido ficou mais próximo do original e daquilo que Jesus ensina na oração do Pai Nosso”, garantiu.
Ainda durante a entrevista, o bispo falou sobre se a mudança na versão italiana poderia causar algum tipo de ajuste ou adaptação à tradução oficial brasileira: “A nossa tradução, que está de acordo também com o missal português, permanecerá tal como está”, disse.
Confira a entrevista na íntegra:
No ano passado, o Papa Francisco aprovou a alteração de um pequeno trecho do Pai Nosso que diz: “E não nos deixeis cair em tentação” (Mt6, 13). Em alguns idiomas, como o italiano, o francês e o inglês, essa frase é rezada como “E não nos submeteis à tentação”, certo? O que o senhor achou da alteração? Por quê?
Foi aprovado o novo missal, isto é, a tradução do novo missal italiano e dentro do novo missal, claro, foi incluído o texto do Pai Nosso com as modificações. Eu não sei se o inglês diz “E não nos submeteis à tentação”. O francês não diz isso, segundo o que andei lendo, o francês diz “Não nos deixeis entrar em tentação”. Essa nova versão do Pai Nosso, o motivo é bastante simples, mas ao mesmo tempo importante. Se procurou uma tradução o mais próximo possível do original porque não é tão simples traduzir de maneira exata a expressão do texto como está no grego, o que é importante é garantir aquele sentido. Deus não coloca empecilhos no caminho do homem e da mulher, Deus não nos dá tentações. O papa recorda que nós não devemos esquecer que a oração começa com “Pai, Pai Nosso” e um Pai não arma cilada aos seus filhos. O cristão, portanto, não está diante de um Deus invejoso que compete com a pessoa humana, que coloca provas à pessoa humana para que ela pudesse cair, de maneira alguma, Deus é o Deus de Misericórdia que está conosco e que nos sustenta na hora da tentação. Por isso, a pergunta sobre a importância desta mudança eu acredito que era necessária, a nossa tradução do português é “Não nos deixeis cair em tentação” e, por isso, a gente entende que na hora da tentação a mão do Pai está estendida para nós, ele que está ao nosso lado para não nos deixar cair na tentação. O texto italiano era como se Deus colocasse tentações para nós, então é importante a tradução nova do texto do Pai Nosso na versão italiana, o sentido ficou mais próximo do original e daquilo que Jesus ensina na oração do Pai Nosso.
A “alteração” na versão italiana do Pai Nosso pode ter repercussão por aqui? Quero dizer: o Pai Nosso que rezamos aqui no Brasil, e em demais países de língua portuguesa, pode sofrer algum tipo de “ajuste” ou “adaptação” ou a nossa tradução oficial brasileira está correta?
As traduções tentam a melhor aproximação do original grego. A nossa tradução que está de acordo também com o missal português ela permanecerá tal como está. Nós não iremos fazer nenhuma mudança no texto do Pai Nosso. Quando sair a nova edição do Missal Romano sairá com o texto como nós o conhecemos dizendo: “E não nos deixeis cair em tentação”. Há uma compreensão entre os estudiosos de que essa tradução estaria bem próxima, no sentido do texto grego, por isso nós não iremos mexer. Portugal e Brasil já estão de acordo com essa orientação e não haverá nenhuma mudança.
Em 2017, a versão em francês do “Pai Nosso” também sofreu um ajuste na mesma frase. Qual é o órgão do Vaticano que, por assim dizer, “fiscaliza” as traduções no mundo inteiro? Ou essa incumbência seria da Conferência Episcopal de cada país? No Brasil, o órgão correspondente é a CNBB, certo? Poderia falar um pouco a respeito?
Em 2017 a versão em francês do Pai Nosso também sofreu um ajuste na mesma frase. Essa incumbência seria da Conferência Episcopal de cada país. A tradução dos textos litúrgicos é um trabalho de grande dedicação, esforço e empenho das Conferências episcopais, então os bispos da França fizeram a proposta da mudança na frase do Pai Nosso, agora nós temos esta outra mudança no texto do italiano na nova edição do missal e nós também como Conferência Episcopal iremos propor à Santa Sé, isto é, a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramento, a tradução do novo missal. O Papa Francisco com a Carta Apostólica em forma de Motu Proprio chamada Magnum Principium ele modificou o código de Direito Canônico fazendo com que as Conferências Episcopais tenham maior liberdade para realizar as traduções, isso não significa que não deveremos enviar nossos textos já aprovados pela Conferência Episcopal, pelas nossas Assembleias Gerais da CNBB ao Vaticano. Lá eles não irão repassar palavra por palavra, mas irão perceber se nós traduzimos tudo, se todo o conteúdo está ali, se aqueles textos que precisam ser comuns a Portugal e Brasil estão de acordo, se as palavras-chave da Oração Eucarística estão de acordo e são aprovadas pelo Papa, enfim, eles irão fazer um grande reconhecimento confirmando a nossa tradução, por isso, à Conferência Episcopal de cada país cabe a tradução e a aprovação na sua nação, depois a Roma cabe esta confirmação do que foi feito no país.
A CNBB realizou a tradução do novo missal. Estamos exatamente nos finais da tradução através de uma Comissão específica, a CETEL, que é responsável pela tradução dos textos litúrgicos. Foi um trabalho de grande dedicação porque as pessoas não se dedicaram só a tradução, eram bispos e latinistas que tomavam parte do seu tempo para fazer isso e, por isso, cada vez que se concluía uma parte do missal, essa parte era apresentada na Assembleia da CNBB, no outro ano a outra parte e assim por diante. Desse modo, a Conferência Episcopal dos Bispos do Brasil tendo a Comissão Episcopal para a Liturgia, esse órgão importante que é a Cetel, ela realizou a tradução do missal e agora nós iremos enviar a Roma, depois que passarmos a próxima Assembleia da CNBB, em abril.