Mineração não é essencial. A vida, sim!

Dom Vicente Ferreira
Bispo Auxiliar de Belo Horizonte (MG)

 

“Escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e tua descendência” (Dt 30, 19)

Acompanhamos, com muita preocupação, os desdobramentos da Pandemia do Covid – 19, em nosso país. Dentre vários desafios que temos, destacamos a relação entre mineração e proliferação do vírus. Se, por um lado, nosso governo federal considera o extrativismo minerário como serviço essencial, e que, portanto, não pode parar, por outro lado, vemos aumentar, assustadoramente, o contágio de trabalhadores e comunidades que vivem em territórios minerários.

Agrava-se, ainda mais, a constatação de que a Pandemia, além evidenciar desigualdades absurdas em nossa sociedade, ela mostra o que chamamos de racismo ambiental. Ou seja, estima-se que o número de óbitos entre pessoas brancas é muito menor do que entre pessoas negras e indígenas, que contraem o vírus. Da mesma forma, algumas cidades onde há atividades minerárias apresentam índices de mortalidade da população contagiada por Coronavírus mais altas da média nacional. Tudo isso nos leva, como Comissão Especial pela Ecologia Integral e Mineração, a seguir um caminho de denúncia das injustiças e anúncios de uma globalização da solidariedade.

Recentemente, vivemos a Semana Laudato Si´, celebrando os cinco anos da Encíclica do Papa Francisco. Um texto fundamental para nossos dias, porque lança para nós o desafiador convite de construir caminhos de Ecologia Integral, cuidando de nossa Casa Comum. Foram muitas e belas inciativas que aconteceram durante a semana. O testemunho de várias lideranças que constroem o Reino de Deus anima-nos em nossa missão. Acalentam-nos, ainda, as tantas campanhas lideradas ou apoiadas pela Conferência Nacional do Bispos do Brasil – CNBB. A campanha emergencial “É tempo de cuidar”, por exemplo, já beneficiou, em um mês, mais de cem mil pessoas do Brasil vítimas da crise sanitária.

A iniciativa “A Amazônia precisa de você” está favorecendo iniciativas de solidariedade para os povos deste bioma. Mais recentemente, fomos convidados a participar, como Igreja, da marcha pela vida, juntamente com outras tantas instituições, em defesa, sobretudo, de nossa democracia. E, assim, tantas outras redes de solidariedade mostram nosso compromisso de amor para com os que mais sofrem.

Queremos reforçar, ainda, nosso apoio ao manifesto “Mineração não é essencial. A vida, SIM!”, assinado por várias organizações eclesiais e civis. Um grito de socorro, sobretudo, em defesa das comunidades que vivem em territórios de mineração. Suas reivindicações contemplam a proteção dos trabalhadores e das comunidades, muitas vezes já enfraquecidas por situações precárias de vida, como alto índice de câncer, doenças respiratórias etc. Campanhas como essa nos fazem lançar a inquieta pergunta: quando tudo é obrigado a entrar em sistema de isolamento social, por que a mineração, que é tão perigosa para o contagio do Coronavírus, não pode parar?

Que o Espírito Santo, fonte de vida que emana do Cristo Ressuscitado, derrame sobre nós os dons necessários para continuarmos enfrentando essa grave Pandemia. E que não tenhamos medo de defender sistemas que operam em favor de nossa vida e dignidade, como o SUS, as alternativas de sustentabilidade econômica que nascem das populações indígenas e quilombolas, as redes de proteção do meio ambiente. E que, como rezou o Papa Francisco, em lugar de gastar nossas riquezas para comprar armas, tenhamos mais investimento na ciência, para combatermos nossos inimigos visíveis – a injustiça social – e invisíveis – esse vírus.

 

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