Dom Orlando Brandes
As eleições fazem emergir alguns fatos que merecem nossa consideração. Bem sabemos que entre nós a “corrupção tornou-se cultura”. Infelizmente é assim. Para mudar este mapa da iniqüidade, é preciso “ética na política”, aplicação da lei 9840 contra a corrupção eleitoral e mais do que isso, educação política, sem esquecer do tema fé e política que ainda é tabu. Não podemos ignorar que a escravidão no Egito, a conquista da Terra Prometida, os escritos proféticos são fatos incontestáveis de fé e política, sem falar das opções de Jesus cujo desfecho são dois processos contra Ele e finalmente sua execução na cruz. Na verdade muitos de nós somos analfabetos em fé e em política. Analfabetismos estes que muito contribuem com a corrupção e o jogo político de ontem e de hoje. Quem em nome da fé se omite na política enquanto Bem Comum, está fazendo péssima política.
Escreveu Bertold Brecht que o “pior analfabeto é o analfabeto político”. Que dizer então do analfabeto religioso? Este ignora a doutrina social da Igreja, a dimensão social da fé e do evangelho, esquecendo-se do juízo final: “Tive fome e não me destes de comer” (Mt 25, 42). Quem toca nestas questões passa por revolucionário, esquerdista, liberacionista, etc. O analfabeto político e religioso não quer saber de política e condena os outros, não percebe que o custo de vida, o preço do pão e da gasolina, do aluguel e dos remédios, depende das decisões políticas e das leis. Da ignorância política prolifera o mal da prostituição, dos assaltos, do menor abandonado, porque a política abrange a economia, a cultura, a administração, a convivência social. “O salário defraudado aos ceifadores clama aos céus” (Tg 5,4).
As eleições proporcionam ainda outra consideração: é o poder do voto dos pobres e das periferias. Em tempo de eleição a periferia vira centro, as questões sociais transformaram-se em pano de fundo dos planos eleitoreiros, os pobres são lembrados e abraçados, ou seja, viram gente importante. Se o povo soubesse o poder do seu voto e se as periferias tivessem consciência que elas decidem as eleições, as coisas seriam diferentes. Churchill escreveu que “os políticos agem pensando nas próximas eleições, enquanto os estadistas trabalham para as próximas gerações”. Precisamos passar do desencanto político para uma militância política, mais ainda, cabe-nos conquistar um verdadeiro “amor político” porque todos somos destinatários e protagonistas da política, enfim, “todos somos responsáveis por todos” (João Paulo II).
As eleições mostram que nossa história política continua a mesma. Mudam as siglas, mas não muda a demagogia, as promessas, a retórica, os favores, os cabrestos. No fundo a ideologia política não se libertou da ambição, do poder e do dinheiro. Porque tantos candidatos? Tantos partidos? Que esperam os financiadores e patrocinadores dos candidatos? Para quem trabalharão os eleitos? Tempo de eleição é tempo de reflexão, tempo de decisão, tempo de conscientização. Não podemos permanecer indolentes, estranhos, indiferentes frente a questões tão decisivas para a sociedade.
Que se apresse o dia da reforma da política brasileira e sejam encurtadas as distâncias entre o Brasil das elites e dos excluídos, dos ricaços e dos miseráveis, dos palácios e dos barracos, dos doutores e dos analfabetos, dos latifundiários e dos sem-terra.
Pensando bem, a política deve ser uma “alta forma de amor fraterno”. Sim, a caridade supõe a justiça e a política deve ser o instrumento, a ferramenta, a mediação da justiça em favor da pessoa, da comunidade e da sociedade.
Precisamos superar os negativismos a respeito de política como: “política é coisa suja, todos os políticos são ladrões; quem pagar leva meu voto, não adianta votar, político só procura pobre quando quer voto, a Igreja não deve se envolver em política”. É preciso encontrar caminhos novos. Política é o bem comum, o interesse pela vida e dignidade da pessoa, promoção humana e convivência pacífica. Ninguém deve abdicar dessa responsabilidade.