Todos irmãos – Parte VI

Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta (RS)

 

Nosso Papa Francisco conclui sua Carta Encíclica Fratelli tutti (Todos Irmãos), de cunho social, com um embasamento teológico. As várias religiões, que temos o privilégio de reconhecer a Deus como Pai criador e fonte de toda a dignidade humana, podem oferecer uma grande contribuição para a fraternidade. Por isso, o título do Capítulo VIII é “as religiões ao serviço da fraternidade no mundo”. Onde está o fundamento da fraternidade humana? “Entre as religiões, é possível um caminho de paz. O ponto de partida deve ser o olhar de Deus. Porque Deus não olha com os olhos, Deus olha com o coração. E o amor de Deus é o mesmo para cada pessoa, seja qual for a religião. E se é um ateu, é o mesmo amor. Quando chegar o último dia e houver a luz suficiente na terra para poder ver as coisas como são, não faltarão surpresas” (FT, n. 281).

A razão humana até pode nos mostrar a necessidade de conhecer a fraternidade, mas, por si só, não consegue fundá-la. “Como crentes, pensamos que, sem uma abertura ao Pai de todos, não podem haver razões sólidas e estáveis para o apelo à fraternidade” (FT, n. 272). O Papa recorda o ensinamento de São João Paulo II, na Carta Centesimus Annus (1991), que afirma de maneira clara que uma das raízes do totalitarismo de quem busca ir ao encontro dos outros é a falta de transcendência. “Se não existe uma verdade transcendente, na obediência à qual o homem adquire a sua plena identidade, então não há qualquer princípio seguro que garanta relações justas entre os homens. […] A raiz do totalitarismo moderno, portanto, deve ser individuada na negação da transcendente dignidade da pessoa humana, imagem visível de Deus invisível” (CA, n. 849). O próprio Papa Francisco já afirmou várias vezes: “quando se pretende, em nome duma ideologia, expulsar Deus da sociedade, acaba-se adorando ídolos, e bem depressa o próprio homem se sente perdido, a sua dignidade é espezinhada, os seus direitos violados” (FT, n. 274). Sim, entre as muitas causas da crise do mundo moderno está a “consciência humana anestesiada e o afastamento dos valores religiosos” (FT, n. 275). Então, sem desprezar os outros, o Papa recorda que “outros bebem doutras fontes. Para nós, este manancial de dignidade humana e fraternidade está no Evangelho de Jesus Cristo” (FT, n. 277). Para nós, “se a música do Evangelho parar de vibrar nas nossas entranhas, perderemos a alegria que brota da compaixão, a ternura que nasce da confiança, a capacidade da reconciliação que encontra sua fonte de nos sabermos sempre perdoados-enviados” (FT, n. 277).

O Papa pede que nos países onde os católicos são minoria, “nos seja garantida a liberdade, tal como nós a favorecemos para aqueles que não são cristãos onde eles são minoria” (FT, n. 279). A liberdade religiosa é um direito universal, que deve ser sempre respeitada. Deus, que não precisa ser defendido por ninguém (cf. FT, n. 285), nos pede o respeito pela sacralidade da vida. O terrorismo deve ser condenado. “É preciso condenar tal terrorismo em todas as suas formas e manifestações” (FT, n. 283).

“Senhor e Pai da humanidade, que criastes todos os seres humanos com a mesma dignidade, infundi nos nossos corações um espírito de irmãos. Inspirai-nos o sonho de um novo encontro, de diálogo, de justiça e de paz. Estimulai-nos a criar sociedades mais sadias e um mundo mais digno, sem fome, sem pobreza, sem violência, sem guerras. Que o nosso coração se abra a todos os povos e nações da terra, para reconhecer o bem e a beleza que semeastes em cada um deles, para estabelecer laços de unidade, de projetos comuns, de esperanças compartilhadas. Amém” (FT, n. 287).

 

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