Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ
Há quase dois anos estamos vivendo uma experiência única e dolorosa em nosso tempo devido à instalação da pandemia do novo coronavírus no mundo inteiro. Sabemos que o vírus é um microrganismo quase que invisível aos olhos humanos. Tem um alto poder de mudar as reações biológicas do nosso corpo.
O novo coronavírus, até então desconhecido pela comunidade científica, tem nos provado o quanto nos preocupamos com a vida e com a vida não só daqueles que amamos ou que esteja próximo a nós, mas a de todos.
Amar ao próximo é um ato que precisa estar em evidência em tempos tão incertos como estes. No Evangelho de Mateus 22,34-40, vamos ouvir como um doutor da Lei interrogou Jesus: “Qual é o maior mandamento?” Esta pergunta feita a Jesus, “para o experimentar”, foi ocasião para o Senhor afirmar a verdadeira hierarquia dos valores à luz de Deus. Este trecho do Evangelho oferece-nos o ensino de Jesus sobre o mais importante de todos os mandamentos: “Amarás o Senhor teu Deus com todo o coração, com toda a alma e com todo o teu espírito”. Jesus acrescenta que o segundo mandamento é semelhante: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo.”
Jesus não veio revogar o Antigo Testamento, veio confirmar e completar o que já estava escrito cumprindo em sua vida a Palavra. Em Êxodo 22,20-26, escutamos as prescrições que deviam ser observadas no trato com os estrangeiros, com as viúvas, com os órfãos e com aqueles que tinham necessidade de pedir algo emprestado para viver. Este ensinamento do Antigo Testamento permanece atual: não se pode separar o amor a Deus do amor ao próximo, porque o Senhor é um Deus compassivo e cuida de todas as suas criaturas. O amor a Deus concretiza-se no amor ao próximo. Ao ser interrogado sobre qual era o maior mandamento, Jesus acrescenta também qual é o segundo, não fosse caso de pensarmos que, ao pretender amar a Deus, se poderia humilhar o próximo.
Para nós, que somos o povo da Nova Aliança, o amor ao próximo não fica apenas na ordem dada por Deus no livro do Levítico: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Lev. 19,18) Agora, temos um Mandamento Novo: “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei!” (Jo. 13,34). Sabemos que Deus nos ama, por isso, também nós devemos amar os nossos irmãos. Santa Terezinha do Menino Jesus, Doutora do Amor,
ajuda-nos a compreender esta passagem da Bíblia dizendo que quando Deus ordenara ao seu povo que amasse o seu próximo como a si mesmo, Jesus ainda não tinha vindo à terra. Sabendo em que grau se ama a própria pessoa, não podia pedir às suas criaturas um amor maior para com o próximo. Mas quando Jesus deu aos apóstolos um Mandamento Novo, o seu mandamento não fala já de amar o próximo como a si mesmo, mas de o amar como Ele, Jesus, o amou, como o amará até à consumação dos séculos.
O amor a Deus é o primeiro mandamento na hierarquia da obrigação, mas o amor ao próximo é o primeiro na ordem da ação. Agora ainda não vemos a Deus, mas mereceremos contemplá-lo, se amamos o próximo. Com o amor do próximo purificamos o nosso olhar, para que os nossos olhos possam contemplar a Deus, como afirma São João: se não amas o teu irmão que vês, como poderás amar a Deus que não vês? Portanto, ama o teu próximo e encontrarás dentro de ti a origem do amor.
Como praticar o amor ao próximo neste tempo desafiador e intenso? Não precisamos pensar muito para descobrir essa resposta, pois um ato importante e indispensável traduz o cuidado e o zelo para com o outro: vacinar-se. O Papa Francisco, em audiência no dia 18 de agosto, disse que se vacinar é um ato de amor. Precisamos concordar com o Santo Padre e criarmos uma consciência de que o outro é valioso, importante e faz parte da obra de Deus. O próprio Santo Padre conclama – em um vídeo difundido pelo site da Rádio Vaticana, junto com vários outros cardeais de todo o mundo, incluso o Cardeal Claudio Hummes, OFM, presidente da Conferência Eclesial da Amazônia – a vacinar por um gesto de amor e de solidariedade cristã.
Quem não se vacina não coloca apenas a própria saúde em risco, mas também a de seus familiares e outras pessoas com quem tem contato, além de contribuir para aumentar a circulação de doenças. Tomar vacinas é a melhor maneira de se proteger de uma variedade de doenças graves e de suas complicações, que podem até levar à morte.
Não podemos concordar com aqueles que emitem notícias e dados sem comprovação e estudo, as chamadas fake news. A prudência e a atenção devem fazer parte de nossa identidade cristã urgentemente. A ciência tem contribuído muito para que essa tragédia possa ser diminuída no mais curto tempo.
Caso esteja com medo ou insegurança em se imunizar, pense em seus familiares, amigos e pessoas que mais ama. Abandonemos os “falsos
deuses”, como nos diz São Paulo na 1 Tessalonicenses (1,5-10), buscando sermos imitadores dele, grande apóstolo do Senhor que amou tanto a Jesus a quem encontrou e que deu sua vida amorosamente pelo bem dos irmãos.