Na 50ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o episcopado brasileiro participou da Santa Missa desta quarta-feira (25), às 7h30, no Altar Central do Santuário Nacional.
A celebração foi presidida pelo bispo referencial da Pastoral Afro-Brasileira, dom João Alves dos Santos, de Paranaguá (PR).
No início da Santa Missa, bispo de São Mateus (ES), dom Zanoni Demettino Castro, citou as palavras de dom Hélder Câmara mostrando o dom de Deus na negritude e a preocupação da CNBB com a causa dos negros.
“Mariama, Nossa Senhora Mãe de Cristo e Mãe dos Homens! Mariama, Mãe dos Homens de todas as raças, de todas as cores, de todos os cantos da Terra. O importante é que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, embarque de cheio na causa dos negros”.
O bispo ainda ressaltou que embora vivamos em um tempo novo ainda precisamos lutar pela causa dos afrodescendentes.
“Somos mais de 20 bispos negros descendentes daquele povo que foi arrancado de suas terras e de sua cultura. Ao longo de nossa história muitos foram os ícones que lutaram por suas causas como o guerreiro Zumbi dos Palmares, padre Vítor, de Três Pontas (MG), Dom Silvério Gomes Pimenta, Nhá Chica entre outros”, acrescentou dom Zanoni.
Em sua homilia, o bispo de Paranaguá (PR), dom João Alves dos Santos reafirmou o compromisso da Pastoral Afro-Brasileira com a suas causas.
“Temos um compromisso evangélico com a promoção e dignidade da vida dos negros. Queremos que a Pastoral Afro-Brasileira esteja sempre mais inserida na missão da Igreja no Brasil, sempre na comunhão com o sucessor de Pedro”, afirmou Dom João Alves dos Santos.
Dom João Alves dos Santos recordou muitos bispos e missionários negros que acreditaram e investiram na educação de suas comunidades.
“Estes irmãos apostaram nas vocações mesmo quando disseram que os afrodescendentes não tinham vocação para os trabalhos da Igreja”, acrescentou.
O bispo Paranaguá afirmou que graças a Deus há vários afrodescendentes considerados santos ou em processo de reconhecimento oficial da Igreja e inúmeros fiéis que vivem o evangelho por tantos cantos do Brasil.
“Aqui está um numero expressivo de bispos negros, nós somos discípulos e missionários presentes nesta multicultural Terra de Santa Cruz e defendemos as causas da nossa pastoral sempre lembrando nossos antecessores”, finalizou.
Leia a íntegra da homilia de hoje:
Homilia de João Alves dos Santos – Missa com Bispos Negros
Eminentíssimos Senhores Cardeais. Eminentíssimos, arcebispos e bispos. Reverendíssimos Senhores Presbíteros, Diáconos e Seminaristas. Aos caríssimos irmãos e irmãs da Vida Religiosa e Institutos Seculares. Queridos Irmãos e irmãs presentes neste santuário Nacional e que nos acompanham através dos MCCs.
Paz e Bem no Ressuscitado!
Reunidos mais uma vez nesta assembleia festiva, celebramos nosso encontro com o Senhor e com a mesma fé e alegria dos primeiros cristãos proclamou: o Senhor ressuscitou! Ele está no meio de nós. Queremos estar com Ele, ouvir sua Palavra e comungar seu corpo e Sangue, vida nova para a nossa vida e sustento para a Missão. Celebramos a festa de São Marcos, apóstolo e evangelista. O seu evangelho nos mostra “quem é Jesus”. Jesus é o Filho de Deus, o Messias servo e libertador, o Mestre e Senhor. O Evangelho de Marcos não apresenta um caminho a percorrer, um itinerário para quem quer seguir Jesus. É o caminho do discipulado. É o caminho da Igreja.
Nos somos discípulos de Jesus. Ele nos chamou para fazermos uma experiência singular de amor com Ele e com nossos irmãos e irmãs. O é ser discípulo? É estar com o mestre, ouvi-lo, aprender dele, deixar-se conduzir por Ele, caminhar com Ele. Nossas comunidades recuperar o dom e o espaço da escuta e da contemplação. A soma desse amor e da convivência entre Jesus e nós chama-se encontro. É esta a proposta da Conferencia de Aparecida, realizada neste lugar sagrado e que também foi assumida por nós bispos, ao definirmos as DGAE: o encontro com Jesus Cristo como fonte e objetivo da missão rumo ao Reino de Deus.
O enfoque de nossa celebração eucarística é Bispos Negros e Pastoral afro-brasileira. Retorno à imagem do discípulo e da discípula.
As crianças negras ou afrodescendentes têm ouvido de discípulo. Recordo-me de minha infância, na comunidade rural: os pais, algumas tias e até mesmo os avós eram nossos catequistas caseiros, auxiliados pelos catequistas oficiais da Igreja. Era muito agradável quando, à noite sentávamos no chão em volta deles para a catequese, para a reza do terço ou também para escutarmos “os causos” – historinhas com ensinamentos para a vida. A palavra dos mais velhos, densa de sabedoria é inquestionável: ouve-se aprendem-se os conselhos e vive-se simplesmente bem. Também os jovens e adultos eram submissos aos idosos. E não se tratava em regime de escravidão, mas sim, de respeito e reverencia.
E o que dizer da partilha e da solidariedade, do serviço braçal compartilhado, da musica, da festa, da dança, da comida, da mãe terra comum que sustenta a experiência comunitária dos Quilombolas e ontem e de hoje? A meu ver tudo concorda com a primeira leitura de hoje em que se exalta a humildade no relacionamento mútuo e nas preocupações porque Deus resiste aos soberbos.
Pena que muitos desses valores foram sufocados na história da sociedade brasileira e pouco incorporados no ser e no agir de nossa Igreja.
Por outro lado queremos louvar a Deus por pessoas que significam muito na História da Igreja no Brasil! Bispos e missionários que acreditaram, investiram na educação, apostaram nas vocações, abriram seminários , quando muitos diziam que brasileiros ou afrodescendentes não tinham vocação para o sacerdócio e a vida religiosa, não serviam para os “trabalhos da Igreja”. Graças ao Senhor e “a ação do Espírito Santo” na história e na fé do nosso povo há vários afrodescendentes, homens e mulheres, considerados santos e em processo de reconhecimento oficial da Igreja, sem falar daqueles e daquelas que vivem o Evangelho, na fidelidade e no anonimato em nossas comunidades e nos distantes rincões do Brasil.
Meus irmãos no episcopado: Aqui está um número expressivo de bispos negros. Vivemos, como nossos antepassados, os valores da cultura, das tradições e da fé católica. Somos discípulos missionários e pastores da Igreja, presente nesta multicultural terra de Santa Cruz. Cruz redentora de Cristo que dá sentido aos nossos sofrimentos e ao nosso povo. Acreditamos representar cerca de 50% da população brasileira que se declara afrodescendente, com quem temos um compromisso evangélico pela promoção e defesa da dignidade da vida para todos.
Queremos que ação evangelizadora da pastoral afro-brasileira, com suas limitações, desafios e projetos, estejam sempre mais inserida, afetivamente e efetivamente na missão da Igreja no Brasil, orientação dos seus pastores e na comunhão com o sucessor de Pedro.
Que o Espírito Santo ilumine a vida e a missão dos agentes de pastoral afro-brasileira nos seu compromisso batismal cotidiano e na busca de um Brasil melhor para todos.
Recordo com alegria e gratidão as palavras de estímulo de Dom Albano Cavalin, Arcebispo Emérito de Londrina, na abertura do 7ª Congresso das Entidades Negras Católicas do Brasil, em fevereiro passado, quando dizia: “que os negros injetem alegria na missão da Igreja”.
Que a Virgem Senhora aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil, negra Mariama nos acompanhe e proteja na peregrinação. Amém!
Aparecida, 25 de março de 2012.
