Dom Pedro José Conti
Aos jovens que vinham ter com ele pela primeira vez o rabi Bunam contava a história do Rabi Ezequias, filho do Rabi Jekel de Cracóvia. Mesmo depois de anos e anos de dura miséria, a confiança que o Rabi Ezequias tinha em Deus não havia sido minada. Em sonho ele recebeu a ordem de ir a Praga para procurar um tesouro debaixo da ponte que conduz ao palácio real. Quando o sonho se repetiu três vezes, Ezequias, de pé, caminhou até Praga. No entanto, a ponte estava sendo vigiada por sentinelas, dia e noite, e ele não teve coragem de cavar no lugar indicado. Todavia voltava para a ponte todas as manhãs, rodeando-a até o entardecer. Enfim o chefe dos guardas, reparou o seu vai e vem, aproximou-se dele e lhe perguntou, amigavelmente, se havia perdido alguma coisa, ou se estava aguardando alguém. Ezequias contou-lhe o sonho que o tinha motivado a ir até ali. O capitão deu uma gargalhada:
– E você, coitado, veio a pé, até aqui, por acreditar num sonho? É loucura confiar nos sonhos. Eu também devia por o pé na estrada para obedecer a um sonho que tive de ir até Cracóvia, na casa de um hebreu, um tal Ezequias, filho de Jekel, para procurar um tesouro que está enterrado na casa dele, debaixo da estufa. Como vou encontrar este homem numa cidade onde metade dos hebreus se chama Ezequias e a outra metade Jekel? – e mais uma vez gargalhou.
Ezequias o saudou, voltou para casa, procurou o tesouro debaixo da estufa e o encontrou. Com o dinheiro encontrado, construiu a sinagoga da sua vila.
Todos nós sonhamos dormindo e, às vezes, acordados. Dependendo do sonho nos perguntamos se devemos acreditar ou não nele. Deixo para a psicologia explicar os sonhos noturnos, resultado do nosso subconsciente. Também não quero falar dos que sonhamos bem acordados, quando olhamos nas vitrines das lojas – mais ainda nesta época de Natal – e que estão muito acima do nosso bolso. É preciso força para não cairmos na tentação de comprarmos e acumularmos dívidas por anos e anos.
Falo dos sonhos bonitos, que nos alegram, que manifestam as nossas aspirações, mais ainda as nossas esperanças. Nesses precisamos acreditar. Assim foi, por exemplo, o sonho de Dom Bosco relatado em suas memórias biográficas e que mereceu um monumento chamado “Ermida” em Brasília. Ele viu, entre os paralelos 15º e 20º, um lugar que no futuro viria a ser uma espécie de terra prometida. Setenta e sete anos depois, lá surgiria Brasília, localizada entre as latitudes 15º 30 e 16º 03. Famoso é também o sonho de Martin Luther King, o líder negro que, nos Estados Unidos, lutou contra a segregação racial e que sonhava ver, um dia, brancos e negros sentados, juntos, à mesa da fraternidade. No sul do Pará, contam o sonho do Padre Cícero que falava das “terras das bandeiras verdes” – que viria a ser a Amazônia – para os nordestinos castigados pela seca.
Cada um de nós poderia falar dos seus sonhos, tanto os da juventude e como os da terceira idade. São os sonhos que acalentamos em relação a nós mesmos, as nossas famílias, aos nossos filhos e netos. Existem também os sonhos e as esperanças de comunidades e povos inteiros, quando lutam por melhorias de vida, pela liberdade e pela justiça. Toda a humanidade deveria hoje sonhar mais com a paz, o respeito à vida, a preservação do planeta que é a casa de todos.
São José também já sonhava antes de sonhar naquela noite. Sonhava com o Salvador. O aguardava com confiança e com a certeza de que Deus não iria decepcionar o seu povo, porque Deus é fiel. O Messias viria para iniciar novos tempos. O que José não podia saber é que iria ser chamado a colaborar para o cumprimento da promessa. Duvidou e teve medo, mas, no final, aceitou porque o sonho dele era também e, sobretudo, o sonho de Deus: estar sempre com o seu povo. Este iria ser o nome da criança que iria nascer: Emanuel. Qual maior sonho dos pobres se não aquele de ter Deus junto deles? Não há riqueza mais preciosa. José acordou e aceitou Maria por esposa. Quando as esperanças dos pobres e de um povo inteiro se juntam com o sonho de Deus, acontecem coisas maravilhosas. A paz, a justiça, a fraternidade e o amor começam a acontecer.
Neste tempo de preparação para o Natal de Jesus, precisamos voltar a ter grandes sonhos e grandes esperanças. Sonhos que não cabem em nenhum embrulho de presente, porque são maiores do que nós; são as dádivas que devemos buscar para todos. Dons que o próprio Deus quer oferecer sempre de novo a todos com a sua presença. Esses grandes sonhos não estão muito longe; estão dentro do nosso coração, precisamos desenterrá-los. Mas o faremos somente se tivermos fé.