Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa aponta necessidade de avançar no respeito às diferenças

Desde 1949, o dia 21 de janeiro é marcado como o Dia Mundial da Religião. No Brasil, em 2007, após um atentado ao terreiro de Candomblé, Ilê Axé Abassá de Ogum, no Bairro de Itapuã, em Salvador (BA), foi decretado que a data também marcaria o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. Em decorrência do ato violento, a Iyalorixá Gildásia dos Santos, conhecida como Mãe Gilda, faleceu de um ataque cardíaco.

Dados mais recentes do Ministério dos Direitos Humanos através do Disque 100, entre 2015 e 2017, mostram que católicos e protestantes são vítimas de 1,8% e 3,8% das denúncias de intolerância religiosa, respectivamente. As denúncias relativas a fiéis do candomblé e da umbanda somam 25% do total. Em contrapartida, segundo pesquisa Datafolha de dezembro do ano passado, os católicos são 50% da população brasileira. Os evangélicos, 31%, e os adeptos de religiões de matriz africana, 2%.

Dados do Centro de Promoção da Liberdade Religiosa & Direitos Humanos (CEPLIR) no Rio de Janeiro, entre abril de 2012 e agosto de 2015, apontam que 71% das denúncias de intolerância religiosa foram feitas por candomblecistas e umbandistas, 8% por evangélicos e 4% por católicos. No período da pesquisa, os dados mostram que a maioria das ocorrências de intolerância são direcionadas às religiões de matriz africana, muitas vezes influenciados por iniciativas de outras religiões.

A violência gerada pela intolerância religiosa resultou no fechamento de 176 terreiros entre janeiro e setembro de 2019, apontam dados do Centro de Referência de Combate à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, ligada à Secretaria de Promoção da Igualdade (Sepromi), do Governo do Estado da Bahia.

Para o assessor da Comissão para o Ecumenismo e o Diálogo Inter-Religioso da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e subsecretário adjunto de pastoral da entidade, padre Marcus Barbosa, a intolerância é o comportamento de não aceitar o que é diferente do mim, do que eu penso, do que eu creio e do que eu faço. “A intolerância dá o braço ao fundamentalismo, à discriminação, ao preconceito, a toda forma de fechamento em si mesmo ou no seu grupo”, disse.

Para ele, a data é um convite à reflexão de como andam as relações entre as religiões; de como anda o respeito e proteção do direito à liberdade religiosa e também das ações concretas que estão sendo realizadas a favor do diálogo e da paz entre as religiões. “É um dia que também nos ajuda a mostrar que estamos ainda longe do mandamento de Jesus: ‘Como eu vos amei, assim também deveis amar-vos uns aos outros’ (Jo 13,34)”, aponta.

O Observatório Racial Dom José Maria Pires, articulado pela Comissão Brasileira de Justiça e Paz (CBJB), publicou, na quarta-feira, 20 de janeiro, uma mensagem na qual afirma “Há datas para celebrar fatos que nos orgulham como Nação. Outras para comemorar feitos que nos edificam enquanto brasileiros. Existem também aquelas, como o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, que nos convocam à luta pela igualdade, por uma sociedade mais fraterna, em que o respeito seja imperativo a uma convivência entre os diferentes, que assim tornam-se unidade no amor”.

O que propõe a Igreja Católica

 

O subsecretário adjunto de pastoral da CNBB reforça que a Igreja Católica já deu passos importantes no sentido de reconhecer a liberdade religiosa. Ele aponta a declaração Dignitatis Humanae, sobre a liberdade religiosa, aprovada pelo Concílio Vaticano II no dia 07 de dezembro de 1965. O documento afirma, em suas primeiras linhas, que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa e sublinha que deve ser assegurado por todas as nações.

Padre Marcus Barbosa destaca também o pensamento mais recente da Igreja Católica sobre o tema, expresso na Encíclica Fratelli Tutti do Papa Francisco: “Existe um direito humano fundamental que não pode ser esquecido no caminho da fraternidade e da paz: é a liberdade religiosa para as pessoas que creem de todas as religiões. Esta liberdade manifesta que podemos encontrar um bom acordo entre as culturas e as religiões diferentes; testemunha que as coisas que temos em comum são tantas e tão importantes que é possível identificar um caminho de convivência serena, ordenada e pacífica, na aceitação das diferenças e na alegria de sermos irmãos porque somos filhos de um único Deus” (279).

No Brasil, além do Artigo 19, Inciso I, da Constituição do Brasil, há vários dispositivos que condenam a discriminação religiosa. A lei federal 7 716, alterada pela lei 9 459 é uma delas. A condenação à prática também é prevista no artigo 208 do código penal: “Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: Pena – detenção, de um mês a um ano, ou multa.”. Parágrafo único – “Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.”

Segundo o assessor da Comissão para o Ecumenismo e o Diálogo Inter-Religioso da CNBB existem iniciativas na Igreja no Brasil que podem ser consideradas como boas práticas que ajudam a superar a intolerância religiosa. Uma delas é a realização da Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano. A campanha tem como tema: “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor” e o lema: “Cristo é a nossa paz: do que era dividido fez uma unidade” (Ef 2, 14). O padre destaca também o trabalho que as organizações religiosas e ecumênicas vêm desenvolvendo para promover o diálogo, a oração e a partilha entre as diferentes religiões.

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