O dia 31 de outubro concluiu uma série de celebrações e eventos relacionados aos 500 anos da Reforma Protestante, recordando a publicação das 95 teses de Martinho Lutero, o monge agostiniano alemão que questionou a Igreja Católica e deu início a uma transformação religiosa no mundo. Para além da lembrança de um evento que provocou ruptura na Igreja, este ano “teve uma densidade ecumênica muito consistente em todas as partes do mundo”, analisa o bispo de Barra do Piraí-Volta Redonda (RJ), dom Francisco Biasin, que preside a Comissão Episcopal Pastoral para o Ecumenismo e o Diálogo Inter-Religioso da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

“Com a graça de Deus e o empenho de muitos cristãos, o ano de 2017 está se tornando um verdadeiro Kairós – um momento de Deus e uma hora de novos desenvolvimentos – nas relações entre católicos e luteranos e talvez, mais amplamente na comunhão ecumênica dos cristãos”, afirma o bispo.
Dom Biasin comenta a Declaração Conjunta assinada pelo papa Francisco e o então presidente da Federação Luterana Mundial, na qual há o comprometimento a “prosseguir juntos o caminho ecumênico rumo à unidade pela qual Cristo rezou”. A declaração ressalta, ainda, que “pela primeira vez, luteranos e católicos viram a Reforma de uma perspectiva ecumênica”, “o que tornou possível uma nova compreensão daqueles eventos do século XVI que levaram à nossa separação”.
De acordo com dom Francisco Biasin, esta declaração e o Documento “Do conflito à comunhão”, este assinado pelos presidentes do Pontifício Conselho para a Unidade dos Cristãos e da Confederação Luterana Mundial, “são um marco na história das relações entre as duas Igrejas, fruto sem dúvida de muitos outros encontros, de muita oração e do esforço comum para fazer cair barreiras seculares e vencer preconceitos históricos”.
Celebrações

Alguns eventos tiveram destaque neste contexto de celebrações, como a comemoração conjunta, realizada em Lund na Suécia, quando em 31 de outubro, o Papa Francisco esteve presente. Aqui no Brasil, como fruto da Comissão de diálogo bilateral católico-luterano, foram realizados dois eventos: um Simpósio Ecumênico Mariológico, em Curitiba (PR), de 1º a 3 de setembro, que tratou do comentário de Lutero ao Cântico de Maria, e a Comemoração oficial dos 500 anos da Reforma, na Catedral metropolitana de Porto Alegre (RS), em 28 de setembro. Dom Biasin ainda destaca as assessorias prestadas pela Comissão e a motivação para as celebrações em dioceses e regionais do Brasil.
Olhar para frente
O contexto das comemorações pelos 500 anos da Reforma é um momento propício para reconhecimento dos pecados e pedidos recíprocos de perdão, considera dom Biasin. É ainda ocasião para deixar para trás “a lógica da suspeita e da contraposição para proceder sempre mais na lógica do encontro e da comunhão”, a qual, segundo o bispo, de fato responde às exigências do Evangelho e constitui o caminho para realizar uma unidade que não é uniformidade nem redução da complexidade a formulas polarizadas numa única direção, mas que, carregando em si a imagem do Deus Tri-uno, seja multifacetada e saiba valorizar a diversidade como dom e ocasião de enriquecimento recíproco.
Dom Biasin ainda destaca a necessidade para os católicos de melhor compreensão “dos intentos mais profundos da teologia de Lutero, pois isso poderá iluminar-nos também hoje, num momento em que as Igrejas, talvez mais do que em outros tempos, se deparam com o desafio da ‘Ecclesia semper reformanda’ (Igreja sempre se reformando)”.
Numa perspectiva de ação para a relação entre católicos e luteranos, o documento do Conflito à Comunhão é a fonte para as ações da Comissão para o Ecumenismo da CNBB neste meio e lança cinco desafios, chamados de “imperativos ecumênicos”, o que para o presidente da comissão são “um verdadeiro programa de ação e ao mesmo tempo um grande apelo à conversão”. São eles:
a) Mesmo que as diferenças sejam mais facilmente visíveis e experienciadas, a fim de reforçar o que existe em comum, católicos e luteranos devem sempre partir da perspectiva da unidade e não da perspectiva da divisão.
b) Luteranos e católicos precisam deixar-se transformar continuamente pelo encontro com o outro e pelo testemunho mútuo da fé.
c) Católicos e luteranos devem comprometer-se outra vez na busca da unidade visível, para compreenderem juntos o que isso significa em termos concretos, e buscar sempre de novo esse objetivo
d) Luteranos e católicos busquem juntos redescobrir a força do Evangelho de Jesus Cristo para o nosso tempo.
e) Católicos e luteranos em sua pregação e serviço ao mundo, devem testemunhar juntos a graça de Deus.“Diante desses imperativos, agora temos que continuar não só a nos encontrar, mas a nos comprometer para que o nosso encontro toque a nossa vida e a vivência das nossas comunidades e assim dar a nossa contribuição para que o sonho de Jesus da plena unidade se torne realidade”, dom Francisco Biasin.