Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)

 

No Evangelho da Sexta-feira da Paixão, acompanharemos com apreensão e tristeza o julgamento de Jesus perante o Sinédrio.

Com idas e vindas e trocas de gentilezas entre Caifás e Pilatos, o julgamento se desenrola, e é profundo e ensurdecedor silêncio de Jesus.

Na fala de Jesus não tem defesa. Ela se resume a breves esclarecimentos semânticos. Mas, logo Jesus, que com grande facilidade, sempre rebateu a todas as investidas dos poderosos, à hipocrisia dos fariseus e, até mesmo, leis antigas e leis do imperador. Jesus, que nunca se furtava ao debate, saindo vencedor em todos eles, agora, na hora de sua Paixão se cala e não se justifica.

Voltemos a nossa atenção para aquilo que está acontecendo: um julgamento! Num julgamento existe acusador e acusado, imputantes e imputados, cuja conclusão se dará pela absolvição e ou pela pena de alguém.

Mas tem um agravante em todo julgamento, o caso das falsas imputações e os falsos testemunhos.

Conhecemos outro julgamento com essas características. O julgamento de Susana em Dn 13. Lá, nos conta a história de uma falsa acusação que levou a um julgamento. Naquele julgamento o que estava em jogo não era o crime duvidoso, mas sim a acusação. É contra ela que o profeta Daniel se levanta. Ele se concentra em desmascarar os acusadores, o que consegue com maestria e inspiração divina.

A reviravolta no caso demonstra como os antigos tratavam esse tipo de julgamento. No caso de uma falsa acusação os acusadores tomavam o lugar do inocentado. A pena lhe era imputada em medida semelhante, como bem nos relata no v 62 de Daniel: “De acordo com a Lei de Moisés, aplicaram o tratamento que tinham querido infligir ao seu próximo: foram mortos. Assim, naquele dia foi poupado uma vida inocente”.

O outro julgamento é narrado nos Evangelhos. Em Lucas 23, ele começa assim: toda a multidão levou Jesus a Pilatos e começaram a acusa-lo.

As trapaças acusatórias já as conhecemos bem. Entretanto, o que nos causa estupor é o fato de Jesus não se defender. Não retrucar naquilo que era a mais fácil de todas as suas contendas. Até os seus juízes estavam inclinados à sua inocência, pois lá pelas tantas, o próprio Pilatos branda: Eu não encontro nenhuma culpa nele.

Mas Jesus não se defende. Ouve e aceita o juízo injusto, culminando com a sua condenação e crucifixão.

Concentrando-me apenas na parte do julgamento, intuo que Jesus, de fato, não podia falar. O seu silêncio não é prova de sua culpa, mas da nossa.

Se Jesus tivesse falado a sua inocência teria sido facilmente demonstrada, e, em seu lugar, os seus acusadores, isto é, todos nós, tomaríamos o seu lugar, porque essa é a regra como já vimos em Dn 13,62.

Jesus não fala! Essa descoberta justifica-se no infindável amor de Deus por sua criatura. Aceitar sobre si mesmo o pecado de muitos, sendo julgado por aqueles que defende e aceitar a pena em seu lugar é a profecia de Isaias atualizada, acontecendo na frente de todos.

A multidão somos todos nós! Justificados na condenação do Justo ainda podemos ouvir o barulho do último grito daquele que não se defendeu, um grito ensurdecedor que clama aos céus, não por vingança, mas por perdão; um perdão que nunca teríamos alcançado com nossas próprias forças, pois só Ele é capaz de bradar: Pai perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!

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