Em artigo na Folha, organizações do Pacto pela Vida e pelo Brasil defendem que a apropriação do Dia da Pátria por obstinados em semear divisões merece repúdio

Nação, essa teia que nos une

7 de setembro de 2021. Momento crucial para refletir sobre o fortalecimento da democracia, em prol de uma sociedade livre, justa e solidária.

Lançando um olhar sobre o Brasil, vemos a data nacional envolvida em ataques extremistas às instituições e rumores de ruptura da ordem. Num plano mais abrangente, poderíamos perguntar o que há para ser celebrado com quase 600 mil mortos pelo coronavírus, 15 milhões de desempregados, 19 milhões de brasileiros passando fome, 5 milhões de crianças fora da escola, recordes de desmatamento e aumento acentuado da desigualdade. Diante de tantas tristes marcas, cabe indagar: como defender e levar adiante este projeto que é de todos, chamado nação?

Há dois séculos juntaram-se as condições objetivas e subjetivas para que o Brasil assumisse o seu destino, supostamente sob o brado de “independência ou morte”. Mas foi a disposição coletiva, mais do que o grito solitário do monarca, que nos impulsionou a seguir adiante, consolidando a independência e inaugurando um projeto nacional.

A nação, como conceito, tem a ver com essa teia de afinidades —históricas, culturais, linguísticas e sociais— que só ganha sentido se compreendida como a união generosa e inclusiva entre pessoas, tomadas como sujeitos plenos de direitos e tratadas com igual respeito e consideração. E é justamente o que nos impulsiona a seguir juntos, do jeito que somos, de onde viemos, para onde queremos ir, no sentimento de pertencer a algo que é base da identidade nacional.

Hoje, a apropriação da nossa data cívica por indivíduos obstinados em semear divisões entre os brasileiros, disseminando o ódio e a intranquilidade para dar passagem a um projeto político de viés personalista, declaradamente autoritário, deve ser repudiada por toda a sociedade. Porque essa apropriação não cabe, e jamais caberá, no projeto de nação que está inscrito na Constituição, tecido por mulheres e homens de todas as raças e todas as crenças, geração após geração. A nação, aos seus, pertence.

Sabemos que governos vêm e passam. Governantes podem entrar para a história pela porta da frente, como servidores do seu povo, ou sair pela porta dos fundos, como demolidores do futuro. Mas, a nação, essa deverá se manter como um projeto coletivo, visando o bem comum. Por isso, em nome das nossas entidades, conclamamos os brasileiros a fortalecer a teia de afinidades que nos irmana e, ao mesmo tempo, nos distingue no mundo. Que isso seja feito através do diálogo construtivo, na garantia plena dos direitos humanos, no respeito à diversidade, no acolhimento aos mais vulneráveis, na preservação do meio ambiente, que é nosso patrimônio comum, e no compromisso com os valores civilizatórios, sempre em defesa da dignidade humana.

As vozes que saem a pregar a discórdia, muitas vezes enganadas ou insufladas por indivíduos guiados apenas pela ambição de poder, tentarão fomentar o caos para justamente esgarçar a teia tão rica que nos une. Que a consciência moral da sociedade prevaleça, mostrando-lhes que uma nação livre e soberana é fruto da convivência humana em clima de paz, respeito e harmonia. Esse é, e sempre será, o verdadeiro brado da brava gente brasileira.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

Felipe Santa Cruz
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

José Carlos Dias
Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns

Luiz Davidovich
Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC)

Paulo Jeronimo de Sousa
Presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)

Renato Janine Ribeiro
Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

Fonte:
Os artigos publicado na seção Tendências/Debates do jornal Folha de S. Paulo, nesta segunda-feira, 6 de setembro de 2021.

 

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